Leia o poema abaixo de Junqueira Freire:
MORTE
(Hora de delírio)
Pensamento gentil de paz eterna,
Amiga morte, vem. Tu és o termo
De dois fantasmas que a existência formam,
— Dessa alma vã e desse corpo enfermo.
Pensamento gentil de paz eterna,
Amiga morte, vem. Tu és o nada,
Tu és a ausência das moções da vida,
Do prazer que nos custa a dor passada.
Pensamento gentil de paz eterna,
Amiga morte, vem. Tu és apenas
A visão mais real das que nos cercam,
Que nos extingues as visões terrenas.
(...)
Amei-te sempre: — e pertencer-te quero
Para sempre também, amiga morte.
Quero o chão, quero a terra — esse elemento;
Que não se sente dos vaivéns da sorte.
Para tua hecatombe de um segundo
Não falta alguém? — Preenche-a tu comigo.
Leva-me à região da paz horrenda,
Leva-me ao nada, leva-me contigo.
Miríadas de vermes lá me esperam
Para nascer de meu fermento ainda.
Para nutrir-se de meu suco impuro,
Talvez me espera uma plantinha linda.
Vermes que sobre podridões refervem,
Plantinha que a raiz meus ossos ferra,
Em vós minha alma e sentimento e corpo
Irão em partes agregar-se à terra.
E depois nada mais. Já não há tempo,
Nem vida, nem sentir, nem dor, nem gosto.
Agora o nada, — esse real tão belo
Só nas terrenas vísceras deposto.
(...)
É possível notar que o eu lírico considera a possibilidade de libertação por meio da emocionalismo, ou seja, ele considera que somente ela seria capaz de libertá-lo de todo o sofrimento. Assim, há a expressão do sentimento contraditório de alívio da dor ante a ideia de morte, que é utilizada como forma de emocionalismo da realidade: a morte é a maneira de não sofrer mais, não adoecer mais, não passar pelos altos e baixos da vida.
Como representante da segunda geração romântica, Junqueira Freire, em seu poema, traz características marcantes de um momento conhecido como “mal do século”, tais como: o pessimismo, a depressão, o culto a morte. Época marcada por um profundo mergulho no mundo íntimo em reação ao sentimento nacionalista vivido pela geração anterior.
O idealismo exagerado dos românticos da primeira geração foi rompido durante as décadas de 1850 e 1860 quando os jovens não mais se identificavam com o ideal que guiou a Revolução Francesa: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”. Assim, o movimento literário ganhou visões carregadas de subjetivismo porque os autores desse período não se interessavam mais por temas como o nacionalismo e o indianismo. Com uma postura exageradamente pessimista, tornaram-se indiferentes aos problemas sociais, atitude que ficou conhecida como “mal do século”. Mergulhados em seu mundo íntimo, tinham apegos a atitudes mundanas, como a bebida e o cigarro, e uma atração pela morte como forma de escapismo de tudo que os incomodava. Esse período foi fortemente influenciado pelo poeta inglês Lord Byron, que valorizava um estilo de vida boêmia, noturna, voltada para os prazeres do mundo e para uma visão de mundo egoísta, narcisista, pessimista, angustiada e satânica. Pelo estilo de vida desregrado, marcado por exageros na bebida e no cigarro e falta de cuidados com a saúde, muitos poetas dessa geração morreram antes dos 20 anos de idade.
Assim, de um sentimento nacionalista, passaram para um sentimentalismo exagerado e, por isso, a época ficou conhecida como ultrarromantismo, quando há uma exaltação dos sentidos e um comportamento impulsivo.
Características da 2ª geração do Romantismo
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Idealização do amor e da mulher amada: guiado pela fantasia e imaginação, a visão de mundo do artista romântico não se baseava em uma perspectiva real dos fatos, mas segundo uma ótica pessoal carregada de contradições e subjetivismo. A mulher ora é descrita como anjo, virgem, angelical; ora como leviana, lasciva, lânguida;
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liberdade de criação e valorização do conteúdo em detrimento da forma: rompimento com os padrões clássicos anteriormente estabelecidos, usando o verso livre para as produções;
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Pessimismo – o artista acha impossível realizar seus desejos e, por isso, coloca-se em profunda tristeza, angústia, solidão, inquietação e depressão, podendo, inclusive, cometer suicídio como forma de escapar do sofrimento;
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Subjetivismo – o romântico utiliza-se de uma percepção pessoal e individual para retratar a realidade em suas obras. Assim, suas palavras são carregadas de individualismo, emoção e fantasia;
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Escapismo psicológico – por não aceitar a realidade como ela se apresentava, os autores românticos voltavam ao passado, individual ou histórico;
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Egocentrismo – prevalência do individualismo com o culto do “eu” interior.
Principais autores e obras
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Álvares de Azevedo: Lira dos vinte anos; Noite na Taverna e Macário;
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Fagundes Varela: Noturnas; Cantos e Fantasias e Anchieta ou O Evangelho nas Selvas;
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Casimiro de Abreu: As Primaveras e A cabana;
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Junqueira Freire: Inspirações do Claustro e Contradições poéticas.
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