O romance brasileiro, cuja tradição teve início na segunda década do século XIX, assumiu o papel de principal instrumento de construção da cultura brasileira em uma tentativa de redescobrir o país através do reconhecimento dos espaços nacionais. Dessa tentativa bem-sucedida, surgiram o romance indianista e histórico, o romance regional e, posteriormente, o romance urbano.
O romance urbano, mais do que qualquer outro tipo de romance, foi o que alcançou maior êxito. A burguesia, vendo-se pela primeira vez retratada nos livros, tornou-se público cativo, conferindo ao romance urbano o prestígio de que ele precisava para ser, ainda hoje, um dos gêneros mais populares entre os leitores. Com uma temática até então inédita, preocupada em reproduzir e criticar os hábitos da sociedade, foi essencial para a consolidação do gênero romance no Brasil, abrindo caminhos para a produção literária posterior, sobretudo para os romances urbanos de Machado de Assis surgidos anos depois.
Entre as principais características do romance urbano esteve a preocupação em retratar a sociedade. A aristocracia perdeu o enfoque, dando lugar aos homens comuns, principais personagens no romance urbano. As ações giravam em torno de fatos corriqueiros da vida burguesa, como complicações sentimentais, sociais e financeiras — problemas comuns à maioria das pessoas —, principalmente na sociedade carioca, principal espaço nos enredos da Literatura produzida à época. O Rio de Janeiro, então capital federal, foi cenário para romances como A moreninha, de Joaquim Manoel de Macedo, cuja sociedade teve seus costumes e manias fielmente retratados.
José de Alencar, Manuel Antônio de Almeida, Joaquim Manuel de Macedo e Érico Veríssimo são os principais representantes do romance urbano brasileiro.
Com Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida, o romance urbano atingiu seu ápice. Diferente da estética do romance romântico, o livro apresentou um estilo único com procedimentos que fugiam ao padrão da prosa romântica vigente. Nele, o protagonista era um malandro, figura simpática e caricata, cujas peripécias eram retratadas com naturalidade. Não há vilões ou heróis, as personagens retratadas eram pessoas comuns, entre elas o barbeiro, a comadre, o delegado, o soldado, entre outros. A linguagem quase jornalística também destoava do romance romântico, que abusava dos recursos expressivos, como a metaforização.
Outro importante representante do romance urbano foi José de Alencar, que, além de ter colaborado com o romance indianista e com o romance regional, foi também um de nossos melhores romancistas urbanos. Entre suas principais obras do período estão Diva, Lucíola e Senhora, nas quais o escritor traçou perfis femininos e abordou a oposição entre o amor e o dinheiro, tematizando o casamento como forma de ascensão social, perspectiva bem diferente da retratada no romance romântico, no qual imperava a idealização do amor e da figura feminina.
O romance urbano foi o responsável por abrir os caminhos para a Literatura que seria produzida na segunda metade do século XIX. O Realismo apropriou-se de temas presentes na Literatura de escritores como Manuel Antônio Almeida e José de Alencar, como a objetividade das descrições e a denúncia de problemas sociais, encontrados principalmente nos romances Senhora e Lucíola, que discutiram, respectivamente, a independência feminina e a ascensão social a qualquer preço e o problema da prostituição nas altas camadas sociais. Embora ainda não possam ser classificadas como obras realistas por estarem presas a certas convenções românticas, a produção literária do romance urbano foi essencial para a discussão dos problemas sociais, sobre os quais o Realismo, representado magistralmente por Machado de Assis, jogaria luzes anos depois.