Estamos diante de um assunto bastante familiar – o refrão. Também chamado de estribilho, encontra-se presente em canções musicais e criações literárias, como os poemas. Possui origens remotas, e é sobre ele, o refrão, que iremos discorrer um pouco mais.
Refrão, provindo do castelhano refrán, constitui um agrupamento de versos ou apenas um verso que se repete ao final de cada estrofe. Sua origem remonta às poesias gregas e latinas, à Bíblia, aos hinos litúrgicos e, sobretudo, às cantigas líricas trovadorescas, principalmente as cantigas de amigo, como esta de Martim Codax (paralelística), expressa a seguir:
Ondas do mar de Vígo, A
se vistes meu amigo! B
E ai Deus, se verrá cedo! Refrão
Ondas do mar levado, A
se vistes meu amado! B
E ai Deus, se verrá cedo! Refrão
[...]
A título de ilustração, vejamos também uma das mais importantes criações da literatura universal, intitulada “O corvo”, de Edgar Allan Poe, traduzida por Machado de Assis:
Em certo dia, à hora, à hora
Da meia-noite que apavora,
Eu, caindo de sono e exausto de fadiga,
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina, agora morta,
Ia pensando, quando ouvi à porta
Do meu quarto um soar devagarinho,
E disse estas palavras tais:
"É alguém que me bate à porta de mansinho;
Há de ser isso e nada mais."*
[...]
E o rumor triste, vago, brando
Das cortinas ia acordando
Dentro em meu coração um rumor não sabido,
Nunca por ele padecido.
Enfim, por aplacá-lo aqui no peito,
Levantei-me de pronto, e: "Com efeito,
(Disse) é visita amiga e retardada
Que bate a estas horas tais.
É visita que pede à minha porta entrada:
Há de ser isso e nada mais."*
[...]
* A parte destacada representa o refrão.
Deparamo-nos com o “mais famoso” refrão de toda criação literária e, para completar, citamos as palavras ressaltadas pelo próprio Poe, nas quais ele revela:
(...) definido o tom de tristeza, foi levado a procurar uma curiosidade artística e empolgante que fosse chave na construção do poema. Passando em demorada revista todos os efeitos de arte conhecidos, não poderia deixar de ver logo que o estribilho é, entre todos, o mais empregado. (...) Decidido que estava a usar um estribilho, pareceu-me inevitável dividir o poema em estrofes para esse estribilho concluir cada estrofe. E para ser conclusão, remate forte, teria de ser sonoro e suscetível de ênfase prolongada.
Fonte: POE, Edgar Allan. Três poemas e uma gênese com traduções de Fernando Pessoa. Lisboa: & etc.p.40.