A necessidade de expor sentimentos, compartilhar experiências, trocar ideias, enfim, interagir com o meio onde vive, revela, sobretudo, o comportamento de nós, seres humanos. Falando assim, a primeira noção que temos acerca de tal prerrogativa é que ela se volta, principalmente, para o âmbito da oralidade. No entanto, esses mesmos posicionamentos se dão, também, no âmbito da escrita.
Dessa forma, ao nos depararmos com a palavra “dissertação”, essa, por sua vez, certamente não nos soa nem um pouco estranha, uma vez que faz parte de uma modalidade textual difundida no ambiente escolar e muito requisitada em concursos e exames de vestibulares. E como é sabido, por integrar a modalidade em referência, perfaz-se de características próprias quanto à sua materialização.
Nesse sentido, afirmamos que a dissertação, antes de tudo, exige duas atitudes básicas do emissor: vontade, disposição para discutir acerca de um determinado assunto e o conhecimento que se tem desse, no intuito de retratá-lo da melhor forma possível. Representa, pois, um tipo de texto no qual prevalecem opiniões sobre os fatos, postura crítica diante dos acontecimentos que norteiam a realidade como um todo e, sobretudo, uma reflexão que contribua para o aprofundamento da discussão que ora se faz presente. Em virtude disso é que os argumentos precisam, antes de tudo, demonstrar credibilidade frente à concepção do leitor, baseados assim em fontes sólidas e confiáveis. Em face desse pressuposto há o predomínio da objetividade, conferindo um tom universal às ideias defendidas. Para tanto, faz-se necessário o uso da terceira pessoa do singular (ele/ela), evitando assim quaisquer traços de envolvimento pessoal por parte de quem escreve.
Até aqui falamos da dissertação em si, elencando suas reais características. Contudo, há outra modalidade de dissertação – denominada dissertação subjetiva –, a qual, como o próprio nome retrata, revela certo envolvimento no que se refere à postura do enunciador, denotando assim um tom mais pessoal e conotativo diante das ideias defendidas. Por essa razão, o emprego da 1ª pessoa do singular (eu) é perfeitamente aceitável.
Dessa forma, no intuito de detectarmos essa abordagem que se dá de uma forma particular, observemos um caso representativo:
Mulher ao Espelho
Hoje, que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.
Já fui loura, já fui morena,
já fui Margarida e Beatriz,
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.
Que mal fez, essa cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se é tudo tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?
Por fora, serei como queira,
a moda, que vai me matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.
Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus,
e morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.
Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.
Cecília Meireles
Fonte: http://www.napontadoslapis.com.br/2009/07/mulher-ao-espelho.htm