Gregório Duvivier é popularmente conhecido por ser humorista. Um de seus trabalhos que mais lhe deram destaque foi o Porta dos Fundos, coletivo de humor criado por, além de outros, Fábio Porchat e Gregório. Porém, Duvivier não se “limitou” a ser, “apenas”, humorista, roteirista e ator. Em 2008, pela editora 7Letras, lançou seu primeiro livro: A partir de amanhã eu juro que a vida vai ser agora.
Apesar de suas produções literárias serem recentes, Gregório arrancou elogios de renomados autores brasileiros, como Millôr Fernandes e Ferreira Gullar. Millôr destacou que Duvivier produz desde haicais a sonetos, e Gullar afirmou que o autor, em A partir de amanhã eu juro que a vida vai ser agora, “brinca inteligentemente com a emoção”.
Tendo em vista que Gregório ainda não é tão popular na literatura quanto é no teatro e na TV, o Alunos Online preparou uma lista com cinco poemas que farão você se apaixonar pela escrita e percepção do mundo de Duvivier.
manuela
manuela, você não
passa de uma gripe
que me entope os
poros: qualquer dia
desses eu te esqueço
num espirro.
Receita para um dálmata
(ou: Soneto branco com bolinhas pretas)
Pegue um papel, ou uma parede, ou algo
que seja quase branco e bem vazio.
Amasse-o até que tome forma
de um animal: focinho, corpo, patas.
Em cada pata ponha muitas unhas
e em sua boca muitos dentes. (Caso
queira, pinte o focinho de qualquer
cor que pareça rosa). Atrás, na bunda,
ponha um fiapo nervoso: será seu
rabo. Pronto. Ou quase: deixe-o lá
fora e espere chover nanquim. Agora
dê grama ao bicho. Se ele rejeitar,
é dálmata. Se comer (e mugir),
é uma vaca que tens. Tente outra vez.
o bairro de botafogo
se fosse um senhor
usaria óculos fundo
de garrafa e daria
bom-dia aos pássaros
cantores que já não
moram na varanda.
ligue os pontos
enquanto você dormia liguei
os pontos sardentos das suas
costas na esperança de que
a caneta esferográfica revelasse
a imagem de algum ser mitológico
de nome proparoxítono o mapa
detalhado de algum tesouro
submerso formasse quem sabe
alguma constelação ruiva oculta
na epiderme e me deparei
com o contorno de um polígono
arbitrário que não me fornecia
metáforas não apontava direções
simplesmente dizia: você está aqui.
posto nove e meio
açaí açaí — você conhece o waldo — olha o mate — waldo que waldo — é o melhor musse do rio
de janeiro — agora joga um spray nas minhas costas — conheço um waldo que morreu —
meumusse é o melhor — o waldo não morreu quem morreu foi o walter — foi o waldo — empada
praiana — foi o walter — sabe que — açaí — no fundo — açaí — eu acho que o nome dele era —
olha — waldo mesmo — o mate — porra tu — guaraplus — tacou spray — guaraplus — no meu
olho — o waldo — mate — ele mesmo — então, morreu — olha o mate — para morrer, meu amigo
— mate — basta estar vivo.
“A poesia pra mim tem que fazer parte da vida, e a vida tem que fazer parte da poesia, senão não serve pra nada.”
(Gregório Duvivier em entrevista para Revista Trip, 2013)