Castro Alves

Castro Alves é um escritor baiano nascido em 14 de março de 1847, na cidade de Muritiba. Considerado o Poeta dos Escravos, era abolicionista. Como autor da terceira geração romântica, não escreveu apenas poemas de amor, mas também uma poesia marcada por seu caráter social. Assim, o poeta transita entre a idealização e o realismo crítico.

Seu poema mais famoso é O navio negreiro, que trata do tráfico de escravos no Brasil do século XIX. Nesse longo poema, o eu lírico leva o(a) leitor(a) até a realidade de um navio negreiro e mostra os horrores da escravidão. Com imagens fortes, adjetivos e exclamações, o poema busca comover cada leitor e leitora, no intuito de que eles sejam inspirados a mudar tal realidade.

Leia também: Naturalismo – escola literária vinculada aos desdobramentos do darwinismo

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Biografia de Castro Alves

Castro Alves é o grande expoente da terceira geração romântica do Brasil.
Castro Alves é o grande expoente da terceira geração romântica do Brasil.

Castro Alves (Antônio Frederico Castro Alves) nasceu em 14 de março de 1847, em Muritiba, estado da Bahia. Em 1854, mudou-se para Salvador, onde estudou no famoso colégio de Abílio César Borges (1824-1891), o Barão de Macaúbas. Mais tarde, em 1864, matriculou-se na Faculdade de Direito do Recife, mas, um ano antes, foi diagnosticado com tuberculose.

Em 1866, o poeta aderiu, oficialmente, à causa abolicionista e também decidiu morar com a atriz portuguesa Eugênia Câmara (1837-1874). Além disso, tornou-se republicano. Em 1868, ele e Eugênia viajaram ao Rio de Janeiro. Ali Castro Alves foi apresentado aos leitores cariocas por José de Alencar (1829-1877) e conheceu Machado de Assis (1839-1908).

Em seguida, o casal foi morar em São Paulo, onde o poeta pretendia continuar o curso de Direito abandonado em Recife. Porém, o relacionamento com a atriz acabou. Não bastasse isso, ele sofreu um ferimento no pé durante uma caçada e, em 1869, seu pé esquerdo, então, foi amputado no Rio de Janeiro. Assim, de volta a Salvador, faleceu em 6 de julho de 1871, devido à tuberculose.

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Contexto histórico da produção de Castro Alves

Castro Alves nasceu e viveu no Brasil Império, particularmente no Segundo Reinado (1840-1889). Na regência de Dom Pedro II (1825-1891), houve dois eventos históricos que marcaram o país. Um deles foi a Guerra do Paraguai (1864-1870), que teve um alto custo, não só financeiro, mas também humano, e que, de certa forma, serviu para enfraquecer a monarquia.

O segundo foi a Abolição da Escravatura, que demorou a acontecer, pois o Brasil foi o último país do Ocidente a abolir a escravidão. No entanto, até chegar ao histórico 13 de maio de 1888, apesar da resistência dos escravistas, a luta abolicionista teve outras conquistas, como a Lei Eusébio de Queirós, que, em 1850, proibiu o tráfico de escravos.

Em 1871, a Lei do Ventre Livre tornou livres, a partir de então, todas as crianças nascidas de mães escravas. E, a partir de 1885, com a Lei dos Sexagenários, os homens e mulheres escravizados que chegavam aos 60 anos de idade eram libertados. Assim, Castro Alves foi influenciado por um contexto de decadência da monarquia e de persistente escravidão.

Leia também: O Brasil poderia ter acabado com a escravidão antes de 1888? 

Características literárias de Castro Alves

A poesia social de Castro Alves coloca esse autor na terceira geração romântica. Assim, apesar de também escrever poemas de amor, o poeta é mais conhecido por sua poesia condoreira. Suas obras, portanto, apresentam as seguintes características:

  • crítica sociopolítica;
  • valorização da liberdade;
  • mais realismo e menos idealização;
  • apelo emocional;
  • teocentrismo;
  • uso de vocativos;
  • abundância de exclamações;
  • presença de hipérboles;

Temas abordados por Castro Alves

O jantar, de Jean-Baptiste Debret (1768-1848), é uma obra que retrata a escravidão doméstica no Brasil em princípios do século XIX.
O jantar, de Jean-Baptiste Debret (1768-1848), é uma obra que retrata a escravidão doméstica no Brasil em princípios do século XIX.
  • O poeta do amor

Em sua poesia amorosa, é possível perceber a transição entre o Romantismo e o Realismo, pois a idealização, tanto do amor quanto da mulher amada, é amenizada, já que a mulher virgem da segunda geração romântica deixa de existir no momento da realização erótica desse amor, distante do platonismo. Além disso, a mulher pálida da geração anterior é substituída pela mulher morena, portanto mais brasileira.

No seguinte trecho do poema “Os três amores”, do livro Espumas flutuantes, podemos observar a realização do desejo erótico.

Os três amores

Na volúpia das noites andaluzas
O sangue ardente em minhas veias rola...
Sou D. Juan!... Donzelas amorosas,
Vós conheceis-me os trenos na viola!
Sobre o leito do amor teu seio brilha...
Eu morro, se desfaço-te a mantilha...
Tu és Júlia, a Espanhola!…

Já no poema “Versos a um viajante”, também de Espumas flutuantes, a mulher brasileira é exaltada:

Tenho saudades das cidades vastas,
Dos ínvios cerros, do ambiente azul...
Tenho saudades dos cerúleos mares
Das belas filhas do país do sul!

Tenho saudades de meus dias idos
— Pét’las perdidas em fatal paul —
Pét’las, que outrora desfolhamos juntos,
Morenas filhas do país do sul!
[...]

  • Poeta dos escravos

A sua poesia abolicionista deu a Castro Alves a alcunha de Poeta dos Escravos. Nesse tipo de poesia, o autor busca sensibilizar o(a) leitor(a) diante do sofrimento de mulheres e homens escravizados, como é possível perceber no irônico “Tragédia no lar”, do livro Os escravos:

Tragédia no lar

Leitor, se não tens desprezo
De vir descer às senzalas,
Trocar tapetes e salas
Por um alcouce cruel,
Que o teu vestido bordado
Vem comigo, mas... cuidado...
Não fique no chão manchado,
No chão do imundo bordel.

Não venhas tu que achas triste
Às vezes a própria festa.
Tu, grande, que nunca ouviste
Senão gemidos da orquestra
Por que despertar tu’alma,
Em sedas adormecida,
Esta excrescência da vida
Que ocultas com tanto esmero?
[...]
Não venham esses que negam
A esmola ao leproso, ao pobre.
A luva branca do nobre
Oh! senhores, não mancheis...
Os pés lá pisam em lama,
Porém as frontes são puras
Mas vós nas faces impuras
Tendes lodo, e pus nos pés.
[...]

Veja também: Cinco poemas de amor de Vinicius de Moraes

Obras de Castro Alves

Capa do livro O navio negreiro, de Castro Alves, publicado pela Global Editora.[1]
Capa do livro O navio negreiro, de Castro Alves, publicado pela Global Editora.[1]
  • O navio negreiro (1968)
  • Espumas flutuantes (1870)
  • Gonzaga, ou a revolução de Minas (1875)
  • A cachoeira de Paulo Afonso (1876)
  • Os escravos (1883)

O navio negreiro é o poema mais famoso do autor. Dividido em seis partes, começa com a indicação do espaço da ação, pois o poema tem um caráter narrativo. “‘Stamos em pleno mar...”, diz o eu lírico, para, em seguida, mostrar o “Veleiro brigue”, isto é, o navio negreiro. Porém, a voz poética, antes de mostrar o horror da escravidão, descreve a natureza em contraste com a realidade:

Bem feliz quem ali pode nest’hora

Sentir deste painel a majestade!...

Embaixo — o mar... em cima — o firmamento...

E no mar e no céu — a imensidade!

Volta, novamente, as atenções para o “barco ligeiro” e pede ao albatroz que nos leve até lá. Em seguida, faz conjeturas sobre a origem da tripulação, para só então baixar, junto com o albatroz, até o navio. Então, o eu lírico expõe os sofrimentos das pessoas que estão sendo transportadas rumo à escravidão:

Era um sonho dantesco... O tombadilho

Que das luzernas avermelha o brilho,

Em sangue a se banhar.

Tinir de ferros... estalar do açoite...

Legiões de homens negros como a noite,

Horrendos a dançar...

O eu lírico expressa seu espanto diante da cena e quer saber “Quem são estes desgraçados”. Eles “São os filhos do deserto/ Onde a terra esposa a luz”. Antes da escravidão, eram “guerreiros ousados”, “homens simples, fortes, bravos”, “crianças lindas”, “moças gentis”. Agora, não passam de “míseros escravos”, “sem ar, sem luz, sem razão”, mulheres “desgraçadas”, “sedentas”, “alquebradas”, com “filhos e algemas nos braços” e “lágrimas e fel” na alma:

Ontem a Serra Leoa,
A guerra, a caça ao leão,
O sono dormido à toa
Sob as tendas d’amplidão...
Hoje... o porão negro, fundo,
Infecto, apertado, imundo,
Tendo a peste por jaguar...
E o sono sempre cortado
Pelo arranco de um finado,
E o baque de um corpo ao mar...

Ontem plena liberdade,
A vontade por poder...
Hoje... cum’lo de maldade
Nem são livres p’ra... morrer...
Prende-os a mesma corrente
— Férrea, lúgubre serpente —
Nas roscas da escravidão.
E assim roubados à morte,
Dança a lúgubre coorte
Ao som do açoite... Irrisão!...

O eu lírico, na conclusão do poema, diz que o Brasil empresta a bandeira para “cobrir tanta infâmia e cobardia!...”. Para ele, o “Auriverde pendão de minha terra”, a Bandeira Nacional, devia ter sido “roto na batalha”, em vez de servir “a um povo de mortalha”. Ele quer dizer, com isso, que o Brasil leva a morte a essas pessoas escravizadas e, por isso, não merece ser considerado uma nação.

Leia também: Poemas de Machado de Assis

Poemas de Castro Alves

Além de O navio negreiro, outro poema de cunho abolicionista de Castro Alves é “Vozes d’África”, do livro Os escravos. O eu lírico começa esse poema com uma invocação a Deus: “Deus! ó Deus! Onde estás que não respondes?”. Então, percebemos que o eu lírico é a própria África:

Qual Prometeu tu me amarraste um dia

Do deserto na rubra penedia

— Infinito: galé!...

Por abutre — me deste o sol candente,

E a terra de Suez — foi a corrente

Que me ligaste ao pé...

Depois de breve descrição da Ásia e da Europa, o eu lírico se volta para si. Continua sua súplica a Deus e diz estar triste, abandonada, perdida. Além disso:

E nem tenho uma sombra de floresta...

Para cobrir-me nem um templo resta

No solo abrasador...

Quando subo às Pirâmides do Egito

Embalde aos quatro céus chorando grito:

“Abriga-me, Senhor!...”

O eu lírico pergunta ao “Deus terrível” se não basta tanta dor e quer saber o que foi que ela fez, que crime cometeu para despertar em Deus vingança e rancor. Afirma, então, que sua desventura começou após o dilúvio:

Desde este dia o vento da desgraça

Por meus cabelos ululando passa

O anátema cruel.

As tribos erram do areal nas vagas,

E o nômade faminto corta as plagas

No rápido corcel.

Ela diz que viu a ciência abandonar o Egito, o povo judeu seguir o caminho da perdição e, por fim: “Depois vi minha prole desgraçada/ Pelas garras d’Europa — arrebatada —/ Amestrado falcão!...”. Nesse ponto, ela fala da escravidão do seu povo, afirma que a “América se nutre” no sangue da África e encerra, assim, o poema:

Basta, Senhor! De teu potente braço

Role através dos astros e do espaço

Perdão pra os crimes meus!

Há dois mil anos eu soluço um grito...

Escuta o brado meu lá no infinito,

Meu Deus! Senhor, meu Deus!...

Já como exemplar da poesia amorosa, em “O gondoleiro do amor”, do livro Espumas flutuantes, o eu lírico diz à sua interlocutora que os olhos dela são negros como “as noites sem luar”, além de ardentes e profundos como “o negrume do mar”. A voz dela é comparada à “cavatina/ Dos palácios de Sorrento”. Já o sorriso é comparado a “uma aurora”. E segue:

Teu seio é vaga dourada

Ao tíbio clarão da lua,

Que, ao murmúrio das volúpias,

Arqueja, palpita nua;

[...]

O eu lírico afirma que o amor dessa mulher é um astro na treva, uma canção no silêncio, brisa na calmaria e abrigo no tufão. Assim, conclui:

Por isso eu te amo, querida,

Quer no prazer, quer na dor... Rosa!

Canto! Sombra! Estrela!

Do Gondoleiro do amor.

Crédito da imagem

[1] Editora Global (reprodução)

Por: Warley Souza

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