Ao longo do período medieval, diversos cristãos começaram a cultuar pessoas consideradas mártires e santos de sua fé religiosa. A trajetória de suas vidas passava a ser exemplos de uma conduta ideal a ser copiada por todo o verdadeiro adorador de Cristo. Porém, o conhecimento sobre os atos destes indivíduos santificados não parecia ser o suficiente para que os fiéis da Idade Média pudessem reafirmar seu ideário religioso.
Partes do corpo e objetos ligados aos santos passaram a ser venerados como elementos que comprovassem materialmente a verdade defendida por esses distintos cristãos. A popularização destes itens de veneração acabou por ampliar uma “produção em série” de relíquias disputadas por diversas igrejas e mosteiros da época. Entre as principais relíquias, aquelas ligadas à vida de Jesus Cristo tinham maior destaque. No entanto, por que essas igrejas tinham tanto interesse em tais ícones?
De acordo com alguns pesquisadores, a posse sobre essas relíquias era capaz de aumentar significativamente o número de doações e freqüentadores deste recinto. Alguns líderes protestantes chegaram a apontar como essa proliferação de relíquias alcançou proporções absurdas. Em alguns de seus textos, João Calvino contabilizou que existiam mais de quatorze pregos da Cruz de Cristo espalhados pela Europa e que as lascas da mesma poderiam encher o carregamento de um navio.
O embasamento doutrinário para essa prática, de fato, não se encontra nos textos hoje da Bíblia. Em textos apócrifos, como o Evangelho da Infância, encontram-se relatos que contam do poder miraculoso de algumas das vestes utilizadas pelo jovem Jesus. A partir de então, não só os objetos, mas também partes do corpo de Cristo passaram a ser buscados e cultuados em diversas Igrejas medievais. Entre as principais partes encontradas (e cultuadas) estão o santo prepúcio e porções do sangue de Jesus.
A mais conhecida das relíquias é o chamado Santo Sudário de Turim. Essa relíquia consiste em uma longa peça de pano onde o corpo do Cristo mortificado foi envolto depois da crucificação. Nos evangelhos o sudário é citado, mas nenhuma outra informação sobre seu paradeiro encontra-se nos textos bíblicos. A veneração ao sudário tem destaque especial principalmente devido às manchas que reproduzem nitidamente as feições e o corpo de Jesus.
As primeiras imagens divulgadas sobre o sudário foram obtidas no final do século XIX, quando Secondo Pia fotografou a peça. Na década de 1970, um grupo de pesquisadores tentou avaliar a autenticidade do Santo Sudário realizando um estudo de cerca de quatro anos. O final da pesquisa acabou concluindo que o desenho encontrado não poderia ter sido feito por meio da ação de algum pintor. No entanto, essa teoria foi refutada em um estudo de 1988, que afirmou se tratar de uma peça medieval.
Para fora do campo da verdade ou da simples fraude, a busca por essas relíquias é uma demonstração clara sobre as formas de manifestação da fé religiosa. Ao mesmo tempo, podemos vislumbrar por de trás de cada uma das histórias destas relíquias uma maneira de se reconstruir o passado com o objetivo de reafirmar uma perspectiva mágica do mundo. Mesmo que não passem de um bando de invencionices, a existência desses mitos demonstra traços ricos do pensamento religioso ao longo da História.