“Primavera dos Povos” é a alcunha que foi dada aos episódios revolucionários que se desdobraram na França no ano de 1848. O ano de 1848 foi considerado como decisivo para a consolidação das insurgências nacionalistas na Europa, fato que acabou com as guerras pela unificação Alemã e Italiana entre as décadas de 1860 e 1870. O político e historiador francês Alexis de Tocqueville, em sua obra Lembranças de 1848: as jornadas revolucionárias de 1848, escreveu o seguinte:
Ao Antigo Regime havia sucedido a Monarquia Constitucional; à Monarquia, a República; à República, o Império; ao Império, a Restauração; depois viera a Monarquia de Julho. Após cada uma dessas mutações sucessivas, foi dito que a Revolução Francesa, tendo acabado o que presunçosamente se chamava “sua obra”, havia terminado: era o que se dizia e no que se acreditava. Ah! Eu mesmo tive esperanças de que isso ocorresse sob a Restauração e até depois dela ter sido derrubada; e eis que Revolução Francesa recomeça, pois é sempre a mesma. À medida que avançamos, seu final se afasta e torna-se obscuro. [1]
Como se vê, Tocqueville concebeu os sucessivos acontecimentos políticos que ocorreram na França a partir de 1789 até a segunda metade da década de 1840 – como o Império Napoleônico e a monarquia liberal de 1830 – como fenômenos de única revolução, cujo caráter desenfreado lhe trazia temor. Continua Tocqueville: Chegaremos – como asseguram determinados profetas (talvez tão enganados quanto seus predecessores) – a uma transformação social mais completa e profunda do que previram e quiseram nossos pais e do que nós mesmos podemos conceber […]? [2] Como foi testemunha (como político que era) dos acontecimentos de 1848, Tocqueville esperava que os desdobramentos não fossem tão sangrentos como ocorrera na fase do Terror jacobino.
Os levantes de 1848 foram organizados pela camada popular, isto é, a baixa burguesia, estudantes e tralhadores. Os motivos principais que incitaram as massas à insurreição foram as crises no campo, como as baixas colheitas no ano de 1846, e as demissões no campo industrial, levadas a cabo em 1847. Já em fevereiro de 1848, as primeiras formas de organização revolucionária impuseram-se. Os revoltosos deliberavam sobre a situação política do país, à época governado pelo “rei burguês”, Luís Felipe I, em banquetes públicos. Muitos dos participantes eram a favor da república, do sufrágio (voto) universal e, em parte, dos ideais socialistas – como era o caso de Louis Blanc, um notório precursor do socialismo na Europa.
Luís Felipe, temendo que a insurreição assumisse proporções maiores, demitiu membros de sua cúpula administrativa, como Guizot, e tentou rechaçar os levantes a qualquer custo, inclusive fuzilando centenas de revolucionários. Essas medidas só inflamaram ainda mais a população, que passou a organizar barricadas em diversos pontos do país. Ao rei sobrou a alternativa de sair da França e exilar-se na Inglaterra.
Com a fuga do rei, o parlamento foi também dissolvido e os revolucionários encontraram uma oportunidade de fundar o que ficaria conhecido como Segunda República da França, que durou até o ano de 1852. Essa Segunda República teve uma estrutura organizada de forma parlamentar, tendo, portanto, primeiros-ministros como representantes. Tal estrutura foi dissolvida com a restauração do Império Napoleônico por Napoleão III, Luís Napoleão Bonaparte, sobrinho de Napoleão, em 1852.
NOTAS
[1] TOCQUEVILLE, Alexis de. Lembranças de 1848: as jornadas revolucionárias de 1848. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. p. 108.
[2] Idem. p. 108.