Entre as grandes revoluções da história humana não constam apenas aquelas ocorridas no âmbito político ou econômico, mas também aquelas que estão na esfera cultural, científica e tecnológica. Os primeiros séculos da Idade Moderna, séculos XV e XVI, testemunharam o desenvolvimento de invenções importantíssimas, que transformaram a forma de ver o mundo e de nele nos situarmos. Entre essas invenções, está a imprensa, de Gutenberg.
Quando falamos em imprensa hoje em dia, ocorre-nos sempre pensar em redações de jornais, isto é, na atividade do periodismo jornalístico. No entanto, o sentido da palavra imprensa, no século XV, estava associado à ação de impressão, ou seja, prensar em papel símbolos gráficos com tinta. O que o alemão Johannes Gutenberg fez, em 1430, foi desenvolver um modelo de máquina de impressão de textos (panfletos, livretos e livros) em caracteres ou tipos móveis. Esses tipos móveis eram feitos de metal (geralmente de chumbo) e cada um trazia a forma de um símbolo gráfico: uma letra, um número, ponto, vírgula etc.
A combinação dos tipos móveis facilitava o processo de feitura de um texto. Antes desse invento, os livros eram compostos artesanalmente, o que demandava um tempo muito grande. Com a imprensa, a leitura passou a se disseminar, inicialmente entre os principados alemães, depois, em todo o continente europeu. A Reforma Luterana teve um papel de importância decisiva nesse processo. As teses e panfletos produzidos por Martinho Lutero contra a Igreja Católica, a partir de 1517, foram reproduzidos por máquinas de imprensa em cidades alemãs.
Foi por essa razão que a circulação das ideias protestantes alcançou uma popularização rápida. Além disso, Lutero traduziu a Bíblia do latim para o alemão, o que gerou uma grande demanda por cópias, demanda essa que foi suprida pelas máquinas de imprensa, como destacam os historiadores Peter Burke e Asa Briggs:
“Depois que as igrejas protestantes se estabeleceram, elas começaram a transmitir suas tradições por intermédio da educação das crianças. Peças, pinturas e impressos agora eram rejeitados em favor da palavra, fosse ela escrita ou falada, Bíblia ou sermão. Por outro lado, na primeira geração ([…] décadas de 1520 e 1530), os protestantes se baseavam no que pode ser chamado de 'ofensiva da mídia', não somente para comunicar suas próprias mensagens, mas também para enfraquecer a Igreja Católica, ridicularizando-a, usando o repertório tradicional do humor popular para destruir o inimigo pelo riso.” [1]
Da formação das comunidades de leitores em torno de círculos protestantes, nos séculos XVI e XVII, passaríamos, a partir do século XVIII, à formação das comunidades de leitores em torno de outros tipos de livros (em idiomas vernáculos/ nacionais), sobretudo associados a escolas literárias, como o Romantismo. A eficiência da imprensa enquanto dispositivo tecnológico encontrou seu triunfo nos séculos XVIII e XIX, quando se tornou, efetivamente, uma indústria.
NOTAS
[1] BURKE, Peter e BRIGGS, Asa. Uma história social da mídia: de Gutenberg à Internet. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004