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O que foi a Guerra da Restauração?
A chamada Guerra da Restauração caracterizou-se por uma sucessão de confrontos entre os exércitos português, espanhol e holandês entre 1640 e 1668. Essa guerra foi motivada por um movimento de restauração do trono português, que, em 1º de dezembro de 1640, aclamou D. João IV rei de Portugal. Esse fato ocorreu após sessenta anos da união dos tronos espanhol e português, efetuada pelo rei Felipe II, da Espanha. Felipe II uniu os dois tronos ibéricos, tornando-se rei após o desaparecimento do jovem rei português D. Sebastião, na Batalha de Alcácer-Quibir, em 1578, e da morte do sucessor idoso deste, o cardeal Dom Henrique I, falecido em 31 de janeiro de 1580.
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União Ibérica e ruptura com a Holanda
Felipe II, da Espanha, era um dos mais poderosos monarcas do fim do século XVI. Ele era neto de D. Manuel I, rei de Portugal, morto em 1502. Sendo assim, era um dos três aristocratas candidatos a assumir o trono – os outros dois eram Catarina, infanta de Portugal e Duquesa de Bragança, e Antônio, Prior do Crato, ambos também netos de D. Manuel I.
A maior parte dos membros da principal instituição da época, o Conselho de Governadores do Reino de Portugal, ofereceu apoio à aclamação do monarca espanhol, mas houve resistência armada do Prior do Crato. Felipe II também mobilizou seus exércitos para dentro de Portugal, que ocuparam várias cidades do reino sem grande dificuldade. Além da força de seus exércitos, Felipe II ainda contou com o apoio do duque de Alba, Fernando Pimentel, que derrotou a resistência do Prior do Crato e garantiu a sujeição portuguesa ao rei da Espanha.
Em 1581, Felipe II foi coroado rei de Portugal, recebendo o título de Felipe I. Com isso, começava entre os lusitanos a dinastia dos Habsburgos, marcada pela União Ibérica. Essa união provocou uma reviravolta política e econômica nas colônias portuguesas de ultramar, isto é, na América do Sul, na África e na Índia. A reviravolta ocorreu pelo seguinte fato: a Espanha dos Habsburgos era a principal potência católica do período; uma época marcada pelas guerras civis religiosas decorrentes das Reformas.
Portugal, mesmo sendo também um país católico, até 1580, mantinha uma relação amistosa e comercialmente equilibrada com as potências protestantes, principalmente com a Holanda, que refinava o açúcar produzido nas colônias portuguesas e era detentora das poderosas organizações econômico-militares: Companhia das Índias Oriental e Ocidental.
Com a União Ibérica, os holandeses, avessos ao imperialismo e à autoridade católica espanhola, romperam os acordos firmados com os portugueses e invadiram as colônias lusitanas, entre elas o Brasil – na região Nordeste. Esse é um dos pontos do problema para se entender como foi complicada, a partir de 1640, a restauração da autoridade real portuguesa. O outro ponto é a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), em especial o seu último período, conhecido como Período Francês.
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Guerra dos Trinta Anos e a Revolta do Manuelinho de Évora
A Guerra dos Trinta Anos foi uma sucessão de confrontos entre as dinastias aristocráticas europeias decorrente de motivos diversos, como: divergências religiosas, disputa sucessória e posse de terras. Nesse contexto, houve um acirramento das tensões entre Espanha e Holanda, o que agravou a situação nas colônias portuguesas.
Em 1635, a França, que já disputava regiões do Mediterrâneo com a Espanha, declarou guerra a essa última, dando origem a um dos mais complicados e dispendiosos conflitos da Guerra dos Trinta Anos. Para custear a guerra contra a França, a Espanha reivindicou a ajuda militar e financeira de Portugal. Para tanto, a Coroa espanhola aumentou os tributos cobrados aos portugueses. O aumento dos impostos para financiar a guerra foi o estopim para a primeira revolta lusitana contra a monarquia espanhola.
Em 1637, na cidade de Évora, na região do Alentejo, em Portugal, ocorreu a chamada Revolta do Manuelinho de Évora. A revolta teve início em 21 de agosto e foi organizada por um grupo de conspiradores encabeçados pelo Procurador e Escrivão da cidade. Para manter o anonimato sobre a autoria das ordens de rebelião endereçadas à população de Évora, os conspiradores assinavam-nas com o nome de Manuelinho, um conhecido doente mental que vagueava pelas ruas daquela cidade.
A ação em Évora logo se alastrou para outras regiões de Portugal, mas todos os focos foram debelados pela força militar castelhana. Contudo, a centelha estava lançada e, três anos mais tarde, um “barril de pólvora” político estourou em Portugal com a chamada Restauração da Independência.
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Revolta da Catalunha e Restauração da Independência
A guerra contra a França avançou, nos anos finais da década de 1630, para dentro do território espanhol, o que provocou um progressivo enfraquecimento das defesas de Filipe IV (rei naquela altura). Um dos reflexos desse enfraquecimento foi um levante por parte dos espanhóis contra o reinado. Os espanhóis catalães promoveram a chamada Revolta da Catalunha em agosto de 1640. Além de demonstrarem explícita contrariedade à guerra, também buscavam a sua independência do restante da Espanha.
Foi nesse contexto, aproveitando-se da revolta catalã, que uma parte da elite lusitana, flagrantemente descontente com o que ocorria com seus antigos domínios, elaborou uma conspiração para romper definitivamente com a Espanha. A conspiração foi tramada por 40 fidalgos que convenceram o então duque de Bragança, D. João, a aderir ao plano. D. João era o nobre mais bem cotado para assumir o trono, já que era neto da duquesa Catarina de Bragança.
O plano dos conspiradores consistiu em estimular, secretamente, a revolta em vários pontos do reino, tanto em zonas urbanas quanto em zonas rurais, ao longo do ano de 1640. No dia 1º de dezembro desse ano, os levantes contra os espanhóis tomaram conta de Portugal, e o duque de Bragança foi aclamado o novo rei sob o título de D. João IV de Portugal, dando início à dinastia de Bragança, a mesma de D. João VI, pai de D. Pedro I.
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Situação logo após a Restauração
Todavia, com a revolução do dia 1º de dezembro, os problemas de Portugal não se resolveriam tão cedo. Não seria possível restaurar o antigo império do modo como existia no período anterior a 1580, sobretudo porque parte considerável das colônias havia sido tomada pelos holandeses, que não estavam dispostos a devolvê-las voluntariamente. Além disso, a guerra contra a Espanha estava declarada. Portugal, contudo, não tinha um exército organizado.
A sorte de Portugal, para a consolidação da Restauração, dependia de um fator principal: o desenrolar da Guerra dos Trinta Anos e as consequências desse conflito para a Espanha e para a Holanda, que já haviam se desgastado muito com as batalhas.
Portugal, aos poucos, conseguiu reorganizar o seu exército. As batalhas para a expulsão dos holandeses do Nordeste do Brasil, nos anos de 1648 e 1649, contribuíram para dar unidade aos grupos de combatentes. A marinha portuguesa também pressionava os navios da Companhia das Índias Ocidentais, e outros destacamentos de soldados lutavam em Flandres. Parte desses soldados, à medida que as batalhas iam sendo ganhas, voltavam para Portugal a fim de reforçar as linhas de frente contra os espanhóis – que, por sua vez, ainda continuavam em guerra contra a França e também contra a Holanda.
Além dessas operações militares, havia a favor de Portugal a pressão que a República de Cromwell, assentada na Inglaterra, passava a fazer sobre a Holanda com a declaração de guerra de 1652. Com mais um front de batalha, os holandeses foram obrigados a negociar com Portugal a posse sobre os domínios coloniais a fim de cessar os conflitos.
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Fim da Guerra da Restauração com o Tratado de Lisboa
A situação de conflito entre espanhóis e portugueses prosseguiu ainda até 13 de fevereiro de 1668, quando foi firmado pelos reis Afonso VI, de Portugal, e Carlos II, da Espanha, o Tratado de Lisboa. Com esse tratado, a Espanha finalmente reconheceu o trono português restaurado e a sua independência. Os prisioneiros foram libertados, e alguns territórios sob posse da Espanha, com exceção da ilha de Ceuta, foram devolvidos ao reino português.