Recentemente, os historiadores vêm promovendo a realização de pesquisas que permitem outras vias de comunicação para com o passado. Para fora dos registros oficiais, nomes importantes e grandes acontecimentos têm uma seara de documentos que salientam a relevância e o significado dos acontecimentos consumados. Abandonando os parâmetros de estudo tradicionais, as vozes do passado surgem em objetos de pesquisa que antes seriam irreconhecíveis.
Um bom exemplo disso pode ser visto quando determinamos a formação híbrida dos costumes que integram a cultura brasileira. O nosso grande leque de influências hoje se mostra revelado em festas, expressões, comportamentos socialmente partilhados e, até mesmo, na ceia natalina. Para muitos, aquilo que não passa de uma simples reunião cercada de comida, também assinala os povos que migraram para cá. Em cada prato, podemos ver questões bastante peculiares.
As frutas secas nos remetem a um antiguíssimo costume proveniente do Hemisfério Norte. Os romanos acreditavam que a ingestão desses alimentos funcionava como uma boa saída para a falta de outras opções de comida e também para aplacar os terríveis efeitos das bebidas exageradamente consumidas nos banquetes. Já o requintado champanhe integra mais um dos costumes que revelam nossa proximidade e assimilação dos costumes franceses.
Sem dúvida, muitos dos itens da nossa mesa natalina conferem a profunda influência lusitana. Além da saborosa e econômica rabanada, feita com pedaços de pão dormido, os portugueses também trouxeram o consumo do peru à mesa. O bacalhau com castanhas até poderia também ocupar lugar de prestígio, mas o elevado preço do pescado acabou cedendo espaço para o pernil de porco.
O panetone é fruto da influência dos imigrantes italianos no Brasil. O pão recheado com frutas cristalizadas seria mais um dos legados trazidos das embarcações que cruzaram o Oceano Atlântico, principalmente no século XIX. Segundo consta, a sua criação foi resultado do trabalho de um padeiro enamorado pela filha de seu patrão. Para tentar convencê-lo, o humilde cozinheiro criou o “pão do Toni” tentando agradar o seu futuro sogro.
Até os polêmicos estrangeirismos reservaram o lugar nessa ceia tupiniquim. Ao contrário do que muitos imaginam, o tender não se trata da carne de um animal específico. Ele nada mais é que um pernil de porco defumado que foi pioneiramente importado pelo frigorífico Wilson na década de 1950. Na ocasião, a embalagem dos pernis veio com um selo em inglês escrito tender made (“feito com carinho”), o que levou a propaganda a dar o nome ao produto.
De fato, a nossa mesa corrobora para que o traço multicultural do povo brasileiro seja mais uma vez reafirmado. Em outras celebrações e pratos cotidianos, os sabores e alimentos também carregam a multiplicidade de nossa formação cultural. Não há como negar que o nosso pão de cada dia esteja prenhe de História!