Escravidão no Brasil

A escravidão no Brasil foi um processo violento que durou três séculos. Foram escravizados no país milhões de indígenas e de africanos.

Obra “O jantar”, de Jean Baptiste Debret, como representação da escravidão no Brasil.
Nessa obra de Jean Baptiste Debret, é possível ver uma família branca sendo servida por escravizados no Brasil.

   A escravidão no Brasil foi um regime marcado pela violência que começou por volta de 1530 e durou 300 anos. Seu início esteve atrelado à instalação da colônia portuguesa no país para atender a necessidade de trabalho no campo. Os primeiros escravizados foram os indígenas; depois, os africanos, nos séculos XVI e XVII. Milhões de pessoas foram escravizadas no país, e as consequências disso são observadas ainda na atualidade.

Leia também: Como se deu o lento processo da abolição da escravidão no Brasil?

Tópicos deste artigo

Resumo sobre a escravidão no Brasil

  • A escravidão no Brasil foi um processo violento que durou três séculos.

  • Seu contexto histórico se baseou na demanda de pessoas para trabalharem na exploração do pau-brasil, depois da cana-de-açúcar, e na mineração.

  • Foi possível graças ao mecanismo exploratório mercantilista de Portugal em relação às colônias.

  • Os tipos de escravidão no Brasil foram: a de indígenas e, depois, a de negros africanos. Tivemos escravos de campo ou escravos de eito, escravos domésticos, escravos de aluguel, e escravos de ganho.

  • A prática de escravidão no Brasil era violenta e sem remuneração.

  • A escravização dos indígenas no Brasil foi proibida pela Igreja na metade do século XVIII.

  • A escravização de africanos no Brasil foi iniciada em 1560 e perdurou por três séculos.

  • No Brasil, houve muitos movimentos de resistência pelo fim da escravidão.

  • Por ter sido tão duradoura e cruel, as consequências da escravidão no Brasil podem ser vistas até hoje por meio do racismo e das desigualdades sociais entre negros e brancos.

Contexto histórico da escravidão no Brasil

Até 1530, o Brasil servia como colônia portuguesa apenas para exploração do pau-brasil, e, para tal, utilizava-se de mão-de-obra de indígenas por meio do escambo, um modelo de transação no qual se realiza uma troca entre mercadorias.

Contudo, em 1534, as capitanias hereditárias foram iniciadas pelos portugueses na colônia e, com isso, os engenhos de produção de açúcar foram impulsionados, necessitando-se de maior mão de obra para sua manutenção. Dessa forma, o trabalho escravo aumentou, já que não era desempenhado pelos colonizadores que exploravam a região. Com o tempo, esse número só aumentou, expandindo-se para além da escravização de indígenas, contemplando também a escravização de africanos, que eram comprados no litoral da África.

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Causas da escravidão no Brasil

As causas da escravidão no Brasil estiveram relacionadas a diversos fatores. Remeteram, principalmente, à implementação das capitanias hereditárias e ao início do ciclo econômico da cana-de-açúcar (e, posteriormente, a outros ciclos, como o do ouro). Inicialmente, sabe-se que a escravização se deu com os indígenas, entretanto, eles não lidavam bem com o trabalho forçado. Ainda, os povos originários eram alvo de conversão por parte dos jesuítas, fazendo com que alternativas de aquisição de mão de obra fossem buscadas, como a de negros e negras vindos do continente africano via tráfico negreiro.

Somou-se a isso a indisposição dos colonizadores com o serviço braçal, pois o engenho foi uma produção de larga escala que exigia muito esforço físico, e os colonizadores não se dispunham a isso. A busca pelos lucros na exploração colonial também foi uma grande causa para a forma exploratória e compulsória de trabalho forçado.

Tipos de escravidão no Brasil

Os tipos de escravidão no Brasil foram, primeiramente, a escravidão de indígenas e, posteriormente, a escravidão de africanos.

No sistema escravocrata de africanos, tínhamos os escravos de campo ou escravos de eito (trabalhadores rurais) e os escravos domésticos (dentro das casas). Havia ainda os escravos de aluguel, que eram emprestados para trabalhos em minas e fazendas, rendendo aos seus proprietários uma soma extra.

Um outro tipo de escravidão era a praticada por escravos de ganho, que atendiam no comércio, faziam carregamento de cargas, fabricavam medicações, lavavam roupas, enfim, prestavam serviços em geral. O lucro gerado por eles ficava, em sua ínfima parte, consigo, e, em sua maior parte, com seus donos. Essa renda própria geralmente era usada para comprar comida e, depois, como possibilidade de compra de alforria.

Como era a prática de escravidão no Brasil?

A escravidão (prática em que o sujeito trabalha sem remuneração) ocorrida no Brasil era caracterizada principalmente por:

  • regimes de trabalho exaustivos em lavouras, minas ou mesmo em casas e comércios;

  • condições de alojamento precárias em senzalas;

  • recebimento de pouca alimentação, roupas em farrapos e castigos físicos, que se caracterizavam como torturas, a exemplo dos açoites;

  • ausência de quaisquer direitos decorrente do fato de que os escravizados eram propriedades de seus donos.

Escravização dos indígenas no Brasil

Obra de Jean Baptiste Debret como representação da escravização dos indígenas no Brasil.
 Nessa obra, de Jean Baptiste Debret, é possível ver indígenas sendo escoltados por soldados para serem escravizados.

O auge da escravização de indígena no Brasil se deu entre os anos de 1540 e 1570, quando, principalmente na Bahia e em Pernambuco, os engenhos de cana-de-açúcar foram estabelecidos e lucrativos por meio do sistema de capitanias hereditárias. Os povos originários eram escravizados após serem capturados por meio de roubos e ataques orquestrados pelos colonizadores.

Entretanto, os padres jesuítas se colocaram contra esse tipo de prática, e assim ficou estabelecido que ela só poderia acontecer mediante guerra justa (conflito entre colonos e indígenas). Dessa forma, os indígenas eram submetidos à catequização.

Era empecilho também para a Coroa, na escravização dos indígenas no Brasil, o fato de que, nascidos aqui, os indígenas conheciam muito bem suas terras e sabiam onde se esconder de seus exploradores nas matas e nos rios. Sendo assim, o tráfico negreiro foi adotado como opção mais viável.

Escravização de africanos no Brasil

Obra de Johann Moritz Rugendas como representação da escravização dos africanos no Brasil.
Nessa obra, de Johann Moritz Rugendas, é possível ver o interior de um navio que transportava pessoas da África para serem escravizadas no Brasil.

A escravização de africanos no Brasil teve início em 1560. Isso porque a de indígenas passou a ser proibida na metade do século XVIII. Além disso, os indígenas passaram por um verdadeiro genocídio, fosse por confrontos, fosse pelas doenças trazidas pelos colonizadores (para as quais seus organismos não tinham resposta imunológica, dado o ineditismo da situação).

A escravização de africanos no Brasil se efetivou por meio do tráfico negreiro, que também apresentava maior lucratividade aos portugueses. Em 1720, a quantidade de escravizados africanos já tinha ultrapassado a população de indígenas no país, visto que o preço havia barateado no mercado internacional de escravos.

Os navios negreiros eram chamados tumbeiros, que possuíam porões onde as pessoas eram acorrentadas e muitas morriam no caminho. O percurso do continente africano ao Brasil poderia durar 60 dias e só foi possível porque os portugueses também mantinham colônias na África a partir do século XV.

A ampliação do mercado açucareiro brasileiro intensificou a necessidade de escravos, aumentando o número deles no final do século XVI.

Veja também: Senzala — o alojamento coletivo e com péssimas condições de higiene em que os escravizados eram obrigados a viver

Resistências e o fim da escravidão no Brasil

Várias resistências de escravos foram registradas na história ao longo do tempo, algumas mais organizadas e coletivas e outras simplesmente pela recusa ao trabalho, além das fugas individuais ou coletivas e a formação de quilombos.

Mesmo ainda nos navios negreiros, essas revoltas já começavam, por isso, os feitores diminuíam a comida das pessoas que estavam neles para que não tivessem forças para se rebelarem. Outra tática de coerção era ter tradutores nos navios para as alertarem dos riscos de se insurgirem. Comumente, diz-se que esses escravizados vindos diretamente da África eram mais revoltosos, já que vinham de uma vida livre e dinâmica de guerreiros em seus locais de origem. Entretanto, escravizados nascidos no Brasil também se insubordinavam.

Em maio de 1807, os escravizados haussás insurgiriam organizadamente para tomar Salvador, mas essa revolta foi descoberta antes pelas autoridades e violentamente reprimida. Além das revoltas por questões relacionadas ao trabalho, também havia a presença de elementos religiosos nelas, já que os revoltantes planejavam atacar também as Igrejas. Isso porque se tratava de um povo muçulmano que pretendia tomar o poder local.

Outra revolta igualmente reprimida (inclusive, com execuções) foi a de 1814, na Bahia, dessa vez no interior, onde se formavam os quilombos. Reuniram-se todos e rumaram às fazendas da região, destruindo-as, e também rumo à vila de Itapuã a fim de dominar a cidade de Salvador. Além disso, entre os planos dos revoltosos, constavam o ataque a igrejas católicas e a destruição de imagens dos santos.

Em Campinas, em 1832, a história de planejamento e repressão se repetiu. Quinze grandes propriedades da região seriam o alvo dessa vez, e os escravizados pretendiam também assassinar seus senhores.

Esses foram casos de organizações coletivas, mas existiam ainda fugas individuais, embora mais difíceis. Para sobreviverem depois, esses indivíduos se escondiam nas florestas até encontrarem quilombos já organizados. Durante o século XIX, essa foi uma das táticas mais usadas. Salvador, cidade com grande número de escravizados, passou a ter muitos negros e negras libertas depois, pois havia abrigado muitos desses fugidos.

Entre 1870 e 1880, o movimento abolicionista foi fortalecido, o que fez com que as fugas aumentassem consideravelmente, pois eram impulsionadas por outros já libertos e/ou integrantes do movimento, que amparavam os que fugiam, inclusive com acionamento do poder público para os conflitos.

Aos que fugiam e ficavam na cidade, restava procurarem qualquer tipo de trabalho, na maioria das vezes, bastante precarizado. Ainda, eles viviam em constante situação persecutória, tentando misturar-se aos demais negros e negras do local.

Os quilombos e mocambos foram a forma mais organizada de resistência negra. Os quilombos eram acampamentos militarizados e surgiram na metade do século XVI (o primeiro de que se tem registro surgiu em 1575, na Bahia). O mais famoso deles foi o Quilombo dos Palmares, em Alagoas, que teve 20 mil pessoas e resistiu até 1694. Seus integrantes faziam comércio do que obtinham das matas e do que cultivavam com outros quilombos e pessoas livres ou atacavam e saqueavam engenhos e cidades.

Os quilombos eram todos em locais ermos e de difícil e restrito acesso para se preservarem. Reuniam ali escravos fugidos, muitas vezes juntos de uma mesma fazenda ou individualmente da região. Os senhores e autoridades preocupavam-se com a propagação dos quilombos, gerando a estes duras repressões.

Existiram ainda resistências mais veladas à escravidão, como abortos, suicídios e reiteradas desobediências individuais ou coletivas, o que gerava castigos e torturas.

Todas essas formas de resistência e o movimento abolicionista contribuíram para o fim da escravidão. Pessoas brancas intelectualizadas a favor do fim desse sistema escreviam em jornais artigos defendo a abolição. A lei de abolição definitiva da escravatura no Brasil foi sancionada em 13 de maio de 1888.

Acesse também: Afinal, o Brasil poderia ter acabado com a escravidão antes de 1888?

Consequências da escravidão no Brasil

As consequências da escravidão no Brasil podem ser vistas até hoje na concentração de renda maior às pessoas brancas e no racismo, que se tornou estrutural na sociedade. O Brasil foi o último país a abolir a prática, o que fez com que as consequências dela fossem ainda piores.

Ao abolir a escravidão, não foi feita distribuição de renda, reforma agrária ou qualquer outro tipo de política pública para essas pessoas, e assim elas ficaram, em sua maioria, sem emprego e moradia, tendo que viver do comércio de quitutes e demais itens, na informalidade, bem como passaram a construir e morar nos morros, onde hoje há as chamadas favelas.

Os índices de criminalidade e morte pela polícia entre pessoas negras, sobretudo jovens negros, até os dias atuais, dão-se diretamente como uma consequência nefasta da escravidão. Ao contrário de demais grupos étnicos, como italianos e japoneses, que vieram para o Brasil em demais períodos históricos, recebendo parcelas de terras para morarem, a população negra escravizada advinda dos países da África nunca recebeu o mesmo, ao contrário.

Fontes

CHALHOUB, Sidney. Visões de liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na corte. Cia das Letras: São Paulo, 2011.

PINSKY, Jaime. A escravidão no Brasil. Contexto: São Paulo, 1988.    

Por: Mariana de Oliveira Lopes Barbosa

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