A origem do termo empírico deriva do grego emperikós*, termo que se referia aos médicos que praticavam a medicina a partir apenas das suas experiências (em grego: empeiria). Por derivação de sentido, acabamos atribuindo esse termo àquilo que se refere ao conhecimento que procede apenas da experiência, ou seja, que não considerou investigações racionais a respeito. Em outras palavras, o conhecimento empírico se refere ao campo do conhecimento antes da atividade racional, da atribuição de conceitos e da sistematização.
Se o “empírico” é relativo ao conhecimento que procede da experiência, das sensações e percepções, então, a teoria do conhecimento que compreende o conhecimento humano como derivado da experiência sensível externa ou interna é chamada de Empirismo. Seus principais representantes foram Francis Bacon (1561-1626), Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-1704), George Berkeley (1685-1753) e David Hume (1711-1776).
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O que é o Empirismo?
O Empirismo foi uma corrente filosófica caracterizada pela valorização da experiência como fonte do conhecimento e que rejeita a noção de ideias inatas e/ou anteriores e/ou independentes da experiência, que é entendida como guia e critério de validade. Desse modo, também é possível dizer que, por valorizarem a experiência humana e a realidade concreta, os empiristas se opunham à metafísica especulativa.
O contexto histórico que está por trás do florescimento dessa corrente, sobretudo na Inglaterra e entre anglófonos, é o desenvolvimento econômico desse país a partir do final do século XVI, palco da ascensão econômica e política da burguesia a partir de uma intensa atividade comercial. Outro fator histórico importante foi a transição da monarquia absolutista para um regime político no qual o Parlamento desempenhava papel mais significativo, processo que se expressou na Queda da Dinastia dos Stuarts e a Revolução Gloriosa.
Outro fator foi a criação, em 1660 e com apoio financeiro dos comerciantes de Londres, da Royal Society of London for the Improvement of Natural Knowledge (Real Sociedade de Londres para o Progresso do Conhecimento Natural). Se, por um lado, a criação dessa instituição era do interesse dos comerciantes, pela possibilidade de desenvolvimento técnico que surgiria dela, por outro beneficiava os intelectuais e cientistas que puderam aprofundar seus estudos a respeito da ciência experimental.
Veja abaixo 12 tópicos importantes a respeito de Francis Bacon e 10 tópicos fundamentais a respeito de John Locke, dois dos principais representantes do Empirismo.
12 coisas que você precisa saber sobre Francis Bacon
1) Dados biográficos. Pertencia a uma família de nobres, estudou em Cambridge e fez carreira política no reinado de Jaime I. Interrompeu sua atividade pública ao ser acusado de receber propinas para julgar determinados casos. A Real Society o considerou um de seus inspiradores. É considerado um dos fundadores do método indutivo de investigação científica.
2) Método indutivo. Baseado na observação rigorosa dos fenômenos naturais era constituído de quatro etapas:
a) observação da natureza;
b) organização racional dos dados observados;
c) formulação de hipóteses a respeito dos dados;
d) comprovação das hipóteses por meio de experimentações repetidas.
3) Teoria dos ídolos. O método indutivo foi criado por Bacon a fim de combater os erros provoados pelos ídolos, que dentro de sua filosofia significa falsas noções, preconceitos e maus hábitos mentais. Os ídolos podem ser de quatro gêneros: os ídolos da tribo, os ídolos da caverna, os ídolos do foro e os ídolos do teatro.
4) “Os ídolos da tribo estão fundados na própria natureza humana, na própria tribo ou espécie humana. (…) O intelecto humano é semelhante a um espelho que reflete desigualmente os raios das coisas e, dessa forma, as distorce e corrompe**”;
5) “Os ídolos da caverna são os dos homens enquanto indivíduos. Pois cada um – além das aberrações próprias da natureza humana em geral – tem uma caverna ou uma cova que intercepta e corrompe a luz da natureza: seja devido à educação ou conversação com os outros; seja pela leitura dos livros ou pela autoridade daqueles que se respeitam e admiram** (...)”
6) “Há também os ídolos provenientes, de certa forma, do intercurso e da associação recíproca dos indivíduos do gênero humano entre si, a que chamamos de ídolos do foro devido ao comércio e consórcio entre os homens. Com efeito, os homens se associam graças ao discurso, e as palavras são cunhadas pelo vulgo. E as palavras, impostas de maneira imprópria e inepta, bloqueiam espantosamente o intelecto**”.
7) “Há, por fim, ídolos que migram para o espírito dos homens por meio das diversas doutrinas filosóficas e também pelas regras viciosas da demonstração. São os ídolos do teatro: por parecer que as filosofias adotadas ou inventadas são outras tantas fábulas, produzidas e representadas, que figuram mundos fictícios e teatrais.**”
8) Ruptura. Sua filosofia apresenta uma ruptura em relação à escolástica aristotélica.
9) Conhecimento geograficamente distribuído. Em Nova Atlântida, Bacon afirma que o conhecimento não deveria ser restrito a poucos.
10) Ideia de Progresso. Para Bacon, o progresso acontece a partir do apuramento do método correto baseado em um modelo de ciência prática e de um pensamento crítico. O desenvolvimento intelectual propiciaria uma mudança na vida dos homens.
11) Saber é poder. Bacon pretendia fazer dos conhecimentos científicos uma ferramenta para o controle da realidade e da previsão dos fenômenos. Diz ele: “O homem, ministro e intérprete da natureza, faz e entende quando constata, pela observação dos fatos ou pelo trabalho da mente, sobre a ordem da natureza; não sabe nem pode mais”.
12) Principais obras: Novum Organum (1620), The Advancement of Learning (O progresso do saber – 1605), De augmentis (versão ampliada de O progresso do saber, publicada em 1623), New Atlantis (1627).
John Locke
1) Dados biográficos. Exerceu grande influência em sua época. Decepcionado com o aristotelismo e com a escolástica, aproximou-se do pensamento de Francis Bacon e René Descartes. Ligado à Royal Society. Exilou-se na França em 1675 e só retornou ao seu país em 1688, durante a Revolução Gloriosa.
2) Tábula Rasa. Locke postulava que nascemos com a mente branca, ao que ele se refere como tábula rasa. Isso significa que, para ele, os seres humanos nascem desprovidos de qualquer ideia.
3) O conhecimento. A experiência dá origem ao conhecimento por duas operações:
a) sensação, que oferece à mente uma variada percepção das coisas. As ideias provenientes desse processo eram chamadas de “ideias da sensação”.
b) reflexão, operações da mente em relação às ideias oferecidas pelos sentidos. As ideias provenientes desse processo eram chamadas de “ideias da reflexão”.
4) Qualidades primárias e secundárias. Locke faz a distinção entre qualidades primárias, como forma, extensão e volume, e qualidades secundárias, as demais qualidades de uma substância, como cor, odor e textura. As primárias são aquelas próprias aos objetos ao passo que as secundárias não fazem parte do objeto como substância. Por exemplo, um carro é composto de substâncias como a solidez, extensão e divisibilidade – essas são suas qualidades primárias. Se falamos que um carro é Fusca, amarelo, antigo, estamos falando sobre suas qualidades secundárias.
5) Essência. Para Locke, não podemos conhecer a essência das coisas. Desse modo, não podemos ter sobre elas conhecimento verdadeiro e sim, apenas opiniões e crenças.
6) Conhecimento demonstrativo. Locke admite a existência de um conhecimento não empírico e que deriva da nossa percepção a respeito da relação entre as nossas ideias. Ao contrário do conhecimento formado por meio das percepções sensíveis, o conhecimento demonstrativo é certo e definitivo. Por isso, podemos dizer que Locke não era um empirista radical.
7) Filosofia da linguagem. Para Locke, as ideias são signos mentais das coisas e as palavras são signos das ideias. Isso significa que, quando eu falo “Gabriela quebrou o pé”, minhas palavras fazem a pessoa que me escuta pensar em suas ideias a respeito de “Gabriela”, de “quebrar” e de “pé”. Ao falar, eu tinha formado antes as minhas ideias a respeito dessas palavras. Ou seja, para Locke, o significado das palavras depende da ideia que temos delas em nossa mente e a linguagem é a expressão de um pensamento que existia antes e independentemente dela.
8) Política. Locke partia de sua teoria a respeito do conhecimento para a esfera sociopolítica. Da mesma forma que ele não concebia a existência de ideias inatas, ele não concebia a ideia de poder inato. Assim, ele se opunha ao absolutismo monárquico de sua época que dizia que o poder dos reis tinha origem divina. A sociedade política não seria o resultado de uma transferência dos direitos do indivíduo para o governante.
9) Principal obra. No campo da teoria do conhecimento, sua principal obra foi “Ensaio sobre o entendimento humano”, escrita no decorrer de vinte anos. Nela, elabora uma teoria do conhecimento empirista, antiespeculativa e antimetafísica do conhecimento.
10) Em “Ensaio acerca do entendimento humano” ele diz: “Afirmo que estas duas, a saber, as coisas externas, como objeto da sensação e as operações de nossas próprias mentes, como objeto da reflexão, são, a meu ver, os únicos dados originais dos quais as ideias derivam.” (p. 160)
* JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de filosofia. 4 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006 . Verbete: Empírico.
** BACON, Francis. Novum Organum. 4. ed. São Paulo, Nova Cultural, 1988, p. 213. (Os pensadores)
LOCKE, John. Ensaio acerca do entendimento humano. 2 ed. São Paulo, Abril Cultural, 1978. (Os pensadores)
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