As variedades linguísticas diferenciam-se da norma-padrão por convenções sociais, momento histórico, contexto ou região em que um falante insere-se.
As variações (variantes ou variedades) linguísticas são as ramificações naturais de uma língua, as quais se diferenciam da norma-padrão em razão de fatores como convenções sociais, momento histórico, contexto ou região em que um falante ou grupo social insere-se. Trata-se, pois, de objeto de estudo da Sociolinguística, ramo que estuda como a divisão da sociedade em grupos – com diferentes culturas e costumes – dá origem a diferentes formas de expressão da língua, as quais, embora se baseiem nas normas impostas pela gramática prescritiva, adquirem regras e características próprias. As variações linguísticas diferenciam-se em quatros grupos: sociais (diastráticas), regionais (diatópicas), históricas (diacrônicas) e estilísticas (diafásicas).
Para aqueles que se preparam para o Enem, trata-se de um dos assuntos com maior incidência nas provas de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias.
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Resumo sobre variações linguísticas
Variedades linguísticas |
Ramificações naturais de uma língua que se diferenciam da norma-padrão por convenções sociais, momento histórico, contexto ou região em que um falante insere-se. |
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Definida pelo espaço (região) do falante. Percebida pelo sotaque e regionalismo. |
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Definida pelo grupo social em que o falante insere-se. Percebida pela gíria e pelo jargão. |
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Definida pelo momento histórico. Percebida pelo arcaísmo. |
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Definida pela adequação que o falante faz de seu nível de linguagem à situação comunicativa e ao estilo do gênero textual. |
Tipos de variações linguísticas
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Variedades regionais, geográficas ou diatópicas
São as variedades linguísticas que sofrem forte influência do espaço geográfico ocupado pelo falante. Em um país com dimensões continentais como o Brasil, elas são extremamente ricas (tanto em número quanto em peculiaridades linguísticas).
Essas variantes são percebidas por dois fatores:
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Sotaque: fenômeno fonético (fonológico) em que pessoas de uma determinada região pronunciam certas palavras ou fonemas de forma particular. São exemplos a forma como os goianos pronunciam o R ou os cariocas pronunciam o S.
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Regionalismo: fenômeno ligado ao léxico (vocabulário) que consiste na existência de palavras ou expressões típicas de determinada região.
Em Goiás, por exemplo, normalmente se diz “mandioca”; no Sul, “aipim”; no Nordeste, “macaxeira”.
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Variedades sociais ou diastráticas
São as variedades linguísticas que não dependem da região em que o falante vive, mas sim dos grupos sociais em que ele se insere, ou seja, das pessoas com quem ele convive. São as variedades típicas de grandes centros urbanos, já que as pessoas dividem-se em grupos em razão de interesses comuns, como profissão, classe social, nível de escolaridade, esporte, tribos urbanas, idade, gênero, sexualidade, religião etc.
Para gerarem sentimento de pertencimento e de identidade, os grupos desenvolvem características próprias, que vão desde a vestimenta até a linguagem. Os surfistas, por exemplo, falam diferentemente de skatistas; médicos comunicam-se diferentemente de advogados; crianças, adolescentes e adultos possuem vocabulário bastante diferente entre si. Os grupos mais escolarizados tendem a ser mais formais, enquanto os grupos de menor formação normalmente são mais informais, ou seja, há diferentes registros de linguagem.
Há dois fatores que contribuem para a identificação das variedades sociais:
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Gírias: palavras ou expressões informais, efêmeras e normalmente ligadas ao público jovem.
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Jargão (termo técnico): palavras ou expressões típicas de determinados ambientes profissionais.
Veja a crônica abaixo de Luis Fernando Verissimo, do livro “As mentiras que os homens contam”, acerca do uso das variedades profissionais:
O Jargão
Nenhuma figura é tão fascinante quanto o Falso Entendido. É o cara que não sabe nada de nada mas sabe o jargão. E passa por autoridade no assunto. Um refinamento ainda maior da espécie é o tipo que não sabe nem o jargão. Mas inventa.
– Ó Matias, você entende de mercado de capitais…
– Nem tanto, nem tanto…
(Uma das características do Falso Entendido é a falsa modéstia.)
– Você, no momento, aconselharia que tipo de aplicação?
– Bom. Depende do yield pretendido, do throwback e do ciclo refratário. Na faixa de papéis top market – ou o que nós chamamos de topi-maque -, o throwback racai sobre o repasse e não sobre o release, entende?
– Francamente, não.
Aí o Falso Entendido sorri com tristeza e abre os braços como quem diz “É difícil conversar com leigos…”.
Uma variação do Falso Entendido é o sujeito que sempre parece saber mais do que ele pode dizer. A conversa é sobre política, os boatos cruzam os ares, mas ele mantém um discreto silêncio. Até que alguém pede a sua opinião e ele pensa muito antes de se decidir a responder:
– Há muito mais coisa por trás disso do que vocês pensam…
Ou então, e esta é mortal:
– Não é tão simples assim…
Faz-se aquele silêncio que precede as grandes revelações, mas o falso informado não diz nada. Fica subentendido que ele está protegendo as suas fontes em Brasília.
E há o falso que interpreta. Para ele tudo o que acontece deve ser posto na perspectiva de vastas transformações históricas que só ele está sacando.
– O avanço do socialismo na Europa ocorre em proporções diretas ao declínio no uso da gordura animal nos países do Mercado Comum. Só não vê quem não quer.
E se alguém quer mais detalhes sobre a sua insólita teoria ele vê a pergunta como manifestação de uma hostilidade bastante significativa a interpretações não ortodoxas, e passa a interpretar os motivos de quem o questiona, invocando a Igreja medieval, os grandes hereges da história, e vocês sabiam que toda a Reforma se explica a partir da prisão de ventre de Lutero?
Mas o jargão é uma tentação. Eu, por exemplo, sou fascinado pela linguagem náutica, embora minha experiência no mar se resuma a algumas passagens em transatlânticos onde a única linguagem técnica que você precise saber é “Que horas servem o bufê?”. Nunca pisei num veleiro e se pissasse seria para dar vexame na primeira onda. Eu enjoo em escada rolante. Mas, na minha imaginação, sou um marinheiro de todos os calados. Senhor de ventos e de velas e, principalmente, dos especialíssimos nomes de equipagem.
Me imagino no leme do meu grande veleiro, dando ordens à tripulação:
– Recolher a traquineta!
– Largar a vela bimbão, não podemos perder esse Vizeu.
O Vizeu é um vento que nasce na costa ocidental da África, faz a volta nas Malvinas e nos ataca a boribordo, cheirando a especiarias, carcaças de baleia e, estranhamente, a uma professora que eu tive no primário.
– Quebrar o lume da alcatra e baixar a falcatrua!
– Cuidado com a sanfona de Abelardo!
A sanfona é um perigoso fenômeno que ocorre na vela parruda em certas condições atmosféricas e que, se não contido a tempo, pode decapitar o piloto. Até hoje não encontraram a cabeça do comodoro Abelardo.
– Cruzar a spínola! Domar a espátula! Montar a sirigaita! Tudo a macambúzio e dois quartos de trela senão afundamos, e o capitão é o primeiro a pular.
– Cortar o cabo de Eustáquio!
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Variedades históricas ou diacrônicas
São as variedades linguísticas comumente usadas no passado, mas que caíram em desuso. São percebidas por meio dos arcaísmos – palavras ou expressões que caíram em desuso no decorrer do tempo. Essas variedades são normalmente encontradas em textos literários, músicas ou documentos antigos.
Veja o exemplo a seguir:
Antigamente
Antigamente, os pirralhos dobravam a língua diante dos pais e se um se esquecia de arear os dentes antes de cair nos braços de Morfeu, era capaz de entrar no couro. Não devia também se esquecer de lavar os pés, sem tugir nem mugir. Nada de bater na cacunda do padrinho, nem de debicar os mais velhos, pois levava tunda. Ainda cedinho, aguava as plantas, ia ao corte e logo voltava aos penates. Não ficava mangando na rua, nem escapulia do mestre, mesmo que não entendesse patavina da instrução moral e cívica. O verdadeiro smart calçava botina de botões para comparecer todo liró ao copo d’água, se bem que no convescote apenas lambiscasse, para evitar flatos. Os bilontras é que eram um precipício, jogando com pau de dois bicos, pelo que carecia muita cautela e caldo de galinha. O melhor era pôr as barbas de molho diante de um treteiro de topete, depois de fintar e engambelar os coiós, e antes que se pusesse tudo em pratos limpos, ele abria o arco.
ANDRADE, C. D. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1983 (fragmento).
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Variedades estilísticas ou diafásicas
São as variedades linguísticas que surgem da adequação que o falante faz de seu nível de linguagem ao estilo exigido pelo texto ou pela situação comunicativa. A crônica, por exemplo, é um texto cujo estilo exige uso de linguagem coloquial; a dissertação, por sua vez, exige do redator um estilo de escrita mais formal. Portanto, caberá ao falante ou redator dominar as diferentes variantes a fim de adequá-las à situação comunicativa (mais ou menos formal) e ao estilo exigido pelo texto.
Leia também: Diferenças entre a linguagem culta e a linguagem coloquial
Por que existem as variedades linguísticas se há uma norma-padrão?
A resposta é bem simples. A língua apresenta variações, visto que a própria sociedade divide-se em grupos: há os mais ricos e mais pobres; os que moram nesta ou naquela região; jovens e idosos; os cristão e os budistas; os surfistas e os skatistas; os sambistas e os roqueiros; os médicos e os advogados e assim por diante.
É natural que cada esfera da sociedade adapte as regras da gramática normativa ou o vocabulário de acordo com suas necessidades comunicativas. Por fim, é válido destacar que todos os idiomas possuem variações e que todas elas possuem validade: não há variedade bonita ou feia; certa ou errada, elegante ou deselegante. Elas são apenas diferentes e contribuem para a riqueza cultural de qualquer país.
Exercícios sobre variações linguísticas
Veja a questão abaixo retirada do Enem de 2010:
(Enem) Quando vou a São Paulo, ando na rua ou vou ao mercado, apuro o ouvido; não espero só o sotaque geral dos nordestinos, onipresentes, mas para conferir a pronúncia de cada um; os paulistas pensam que todo nordestino fala igual; contudo as variações são mais numerosas que as notas de uma escala musical. Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí têm no falar de seus nativos muito mais variantes do que se imagina. E a gente se goza uns dos outros, imita o vizinho, e todo mundo ri, porque parece impossível que um praiano de beira-mar não chegue sequer perto de um sertanejo de Quixeramobim. O pessoal do Cariri, então, até se orgulha do falar deles. Têm uns tês doces, quase um the; já nós, ásperos sertanejos, fazemos um duro au ou eu de todos os terminais em al ou el - carnavau, Raqueu... Já os paraibanos trocam o l pelo r. José Américo só me chamava, afetuosamente, de Raquer.
Queiroz. R. O Estado de São Paulo. 09 maio de 1998 (fragmento adaptado).
Raquel de Queiroz comenta, em seu texto, um tipo de variação linguística que se percebe no falar de pessoas de diferentes regiões.
As características regionais exploradas no texto manifestam-se
A - na fonologia.
B - no uso do léxico.
C - no grau de formalidade.
D - na organização sintética.
E - na estruturação morfológica.
Observe que o texto motivador da questão mostra as diferenças regionais quanto à fonologia ou fonética, por isso a resposta é letra A.