No intuito de discorrermos acerca do assunto que se evidencia, subsidiar-nos-emos em dois poemas, os quais pertencem, respectivamente, a Casimiro de Abreu e Manuel Bandeira:
Minh'alma é triste
[...]
II
Minh'alma é triste como a voz do sino
Carpindo o morto sobre a laje fria;
E doce e grave qual no templo um hino,
Ou como a prece ao desmaiar do dia.
Se passa um bote com as velas soltas,
Minh'ahna o segue n'amplidão dos mares;
E longas horas acompanha as voltas
Das andorinhas recortando os ares.
Às vezes, louca, num cismar perdida,
Minh'alma triste vai vagando à toa,
Bem como a folha que do sul batida
Boia nas águas de gentil lagoa!
E como a rola que em sentida queixa
O bosque acorda desde o albor da aurora,
Minha'ahna em notas de chorosa endeixa
Lamenta os sonhos que já tive outrora.
Dizem que há gozos no correr dos anos!...
Só eu não sei em que o prazer consiste.
— Pobre ludíbrio de cruéis enganos,
Perdi os risos — a minh'alma é triste!
[...]
O bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Estudamos tanto nos livros didáticos acerca dos estilos de época, procuramos assimilar sobre as correntes ideológicas as quais nortearam todos eles, enfim... Mas diante de uma análise propriamente dita... Pronto! Dá aquele “branco”. Sem contar que em provas de vestibulares temos de estar aptos a realizar tal procedimento, caso contrário podemos perder a chance de acertar a questão e... já era!
Em face dessa realidade, vamos verificar as disparidades que nortearam ambas as escolas literárias, demarcadas por vertentes distintas. Assim sendo, pautando-nos por questões temáticas, bem como pelas características formais, analisemos os poemas:
Constatam-se na criação de Casimiro de Abreu determinados elementos, tais como egocentrismo, solidão, pessimismo exagerado, melancolia e presença de elementos da natureza, como, por exemplo: mares, folhas, aurora e andorinhas; posto que no Romantismo tais elementos fazem parte do sofrimento do eu-lírico, funcionando como coparticipantes. Notamos também que o sonho e o devaneio são elementos constantes, os quais culminam na desesperança, pelo simples fato da não realização destes. No plano formal, constatamos a presença das rimas, sendo estas alternadas (ABAB), dispostas por meio das estrofes, cada qual formando um quarteto (quatro versos).
Já no poema de Bandeira, sobretudo pelo fato de este pertencer à era modernista, não podemos constatar as mesmas características, tanto no plano formal quanto no plano das ideias (temática). Nele podemos verificar a presença de versos brancos (sem a presença de rimas), bem como de versos livres, abnegados de uma métrica definida. Quanto à temática apresentada, o poeta mistura uma boa dose de ironia, cuja intenção é fazer uma denúncia social – comparando o homem à figura de um bicho. Vê-se diante de tal posicionamento que uma das características da geração modernista se fez prevalecer de maneira magistral: a postura crítica mediante determinados valores sociais.
Estes, dentre muitos outros, são conhecimentos dos quais precisamos dispor, de modo a compreender acerca do que foram as correntes literárias como um todo, cada qual demarcada por posturas e posicionamentos ideológicos distintos.