Guerra Civil Síria

A Guerra Civil Síria é um dos maiores conflitos do século XXI e foi iniciada, em 2011, por conta dos protestos populares conhecidos como Primavera Árabe. A repressão violenta praticada pelo governo de Bashar al-Assad motivou a oposição a se armar e iniciar uma guerra civil que já causou a morte de cerca de 600 mil pessoas.

Leia também: Diferença entre sunitas e xiitas

Antecedentes do conflito

A Guerra Civil na Síria iniciou-se como consequência direta da Primavera Árabe — série de protestos e manifestações populares que se espalharam pelas nações árabes do norte da África e do Oriente Médio, exigindo melhorias democráticas e melhores condições de vida para a população. Esses protestos se iniciaram na virada de 2010 para 2011.

Em 2011, a população síria decidiu protestar contra a ditadura de Bashar al-Assad.[1]

Os primeiros protestos aconteceram na Tunísia, em dezembro de 2010, e chegaram à Síria em março de 2011, na cidade de Deraa, localizada no sul do país. O ponto de partida dos protestos na Síria foram pichações feitas por estudantes menores de 15 anos, em Deraa.

Essas crianças foram presas e torturadas por agentes da polícia secreta síria. A ação do governo gerou uma reação popular, e, em seguida, os protestos alcançaram cidades como Damasco (capital da Síria) e Aleppo. Os protestantes exigiam um governo democrático (o país é governado por Bashar al-Assad desde 2000 e pela família Assad desde a década de 1970).

A resposta do governo sírio foi violenta, e, assim, usou-se a repressão para controlar os protestos que aconteciam no país. Isso resultou em novos protestos, que também foram reprimidos violentamente. A continuidade dessa situação motivou grupos de opositores a se armarem e iniciarem uma rebelião contra a violência das tropas governamentais.

A Guerra Civil na Síria, portanto, teve seu início motivado por disputas políticas entre opositores que se rebelaram contra a ditadura e a violência do governo de Bashar al-Assad. Com a evolução do conflito, ele assumiu proporções de sectarismo religioso (intolerância religiosa) por meio do surgimento de grupos fundamentalistas sunitas, que procuravam tomar o poder do país.

Vale frisar que, atualmente, o governo sírio é secular, isto é, faz separação entre questões estatais/governamentais e princípios religiosos. Ainda, os observadores internacionais consideram que a guerra se iniciou em março de 2011, quando a população passou a desafiar as forças de Bashar al-Assad.

É importante pontuar que as razões do início da guerra foram políticas e que esse conflito atualmente tem grande importância geopolítica no equilíbrio de forças no Oriente Médio. Por essa razão, diferentes nações intervieram, garantindo a continuidade da guerra na Síria. As nações que, de alguma maneira, intervieram no conflito foram: Arábia Saudita, Israel, Turquia, Irã, Estados Unidos e Rússia, principalmente.

Quais são as forças que lutam na Síria?

Após mais de 10 nos, os grupos que atuam na guerra na Síria são distintos, e cada um tem uma motivação específica. De maneira geral, os grupos integrantes do conflito podem ser organizados em tropas governamentais, grupos rebeldes moderados e grupos rebeldes fundamentalistas, além de forças estrangeiras que se aliam com alguns dos participantes.

Dentro dessa divisão, faremos o destaque de alguns grupos. O primeiro é conhecido como Exército Livre da Síria (ELS). Ele surgiu em julho de 2011 e foi formado por opositores de Bashar al-Assad que defendiam medidas democráticas e seculares para a Síria.

O ELS, no entanto, sofreu uma profunda alteração ideológica e atualmente é composto por diversos elementos fundamentalistas islâmicos. Além disso, aliou-se à Turquia na perseguição aos sírios curdos, e, desde 2016, é profundamente dependente do apoio dado pelos turcos. O envolvimento do ELS na guerra perdeu força em meados de 2012.

A Guerra Civil Síria causou milhares de mortes e deixou cidades inteiras destruídas.

Um segundo grupo radicalizado com tendências de fundamentalismo islâmico é o Hayat Tahrir al Sham. Para facilitar o reconhecimento, esse grupo foi conhecido, primeiro, como Frente al-Nusra e, depois, como Jabhat Fateh al-Sham. Muitos analistas internacionais defendem que ele representa o braço armado da Al-Qaeda na Síria, mas ela nega essa aliança. Trata-se de fundamentalistas sunitas que defendem a implantação de medidas ultraconservadoras.

Dentro dos grupos fundamentalistas que atuam na Síria, há também o Estado Islâmico (EI). Esse grupo surgiu como consequência da invasão americana no Iraque e do vácuo do poder que se instalou naquele país. Em 2014, o EI proclamou-se um califado, e, durante um bom período da Guerra Civil Síria, controlou um vasto território sírio.

O EI, no entanto, encontra-se com sua ação praticamente neutralizada na Síria, uma vez que perdeu todos os grandes territórios que havia conquistado. Esse enfraquecimento foi resultado da ação internacional de Rússia e Estados Unidos, além da ação dos curdos, financiados pelos EUA. Atualmente, existe um temor sobre uma possível recuperação do EI.

No lado dos rebeldes moderados, o grande destaque a ser feito é sobre os curdos, uma minoria étnica na Síria (corresponde a 10% da população). O levante militar dos curdos ocorreu, principalmente, por causa da ameaça representada pelo EI a partir de 2014. O EI perseguia e executava populações curdas.

Financiados pelos Estados Unidos, os curdos organizaram-se e conseguiram, pouco a pouco, derrotar as forças do Estado Islâmico. O grande símbolo do enfraquecimento do EI ocorreu quando os curdos conquistaram a “capital” do grupo, a cidade de Raqqa. Os territórios dominados pelos curdos foram nomeados de Federação Democrática do Norte da Síria.

O movimento dos curdos faz parte de uma luta histórica pela autodeterminação e criação de um Estado nacional que os abrigue. É importante frisar que eles formam a maior minoria étnica do mundo sem um Estado nacional próprio e que são perseguidos enquanto minoria tanto na Síria como no Iraque e na Turquia.

Os turcos, inclusive, representam atualmente a maior ameaça à luta dos curdos. O governo turco tem sistematicamente financiado grupos fundamentalistas islâmicos (como o ELS) para que lutem contra os curdos. Além disso, a própria Turquia tomou parte na guerra. No começo de 2018, tropas turcas estavam em território sírio, lutando contra os curdos em Afrin.

Por fim, há também as tropas governamentais de Bashar al-Assad, que lutam pela sua continuidade no poder. A permanência do governante no poder da Síria esteve gravemente ameaçada em meados de 2015, mas a intervenção russa no conflito e o apoio iraniano fortaleceram a resistência. Atualmente a posição de Al-Assad está bem assegurada, e ele controla mais da metade do país.

Intervenção internacional

A Guerra Civil na Síria é, nos dias atuais, um dos conflitos de maior importância geopolítica. Diferentes atores atuam direta ou indiretamente no conflito como forma de garantir os seus interesses no Oriente Médio.

Os russos entraram na guerra, em meados de 2015, sob a alegação de combate ao terrorismo. No entanto, há dois pontos importantes sobre o interesse russo. Primeiro, a Síria é um dos principais aliados da Rússia na região, e, por isso, a manutenção de Bashar al-Assad no poder é fundamental. Segundo, existe um interesse russo em diminuir a influência norte-americana na região.

No caso do Irã, seus interesses, em grande parte, convergem com os dos russos. Há uma intenção iraniana em diminuir a influência norte-americana na região e um interesse em diminuir a influência da Arábia Saudita (nação que exporta a ideologia que alimenta grupos fundamentalistas, como o Hayat Tahrir al Sham). Por fim, a continuidade de Bashar al-Assad no poder é importante porque garante ao Irã continuar financiando o Hezbollah no Líbano.

Acesse também: Wahhabismo, a ideologia que alimenta o fundamentalismo islâmico

Os Estados Unidos têm uma postura ambígua em relação à Síria desde o governo de Barack Obama. No início da turbulência, os norte-americanos armaram grupos rebeldes, e sabe-se hoje que essas armas caíram nas mãos de jihadistas. Atualmente os EUA mantêm uma posição de não apoiar grupos que geram desconfiança em seu governo (como o ELS).

Em 2019, os Estados Unidos decidiram retirar seu apoio aos curdos, deixando-os sozinho na luta contra os jihadistas e os turcos. Mais recentemente, no começo do ano de 2021, os EUA realizaram ataques contra tropas do Hezbollah que estão posicionadas na Síria. O ataque contra o Hezbollah quis enfraquecer o Irã, grande adversário dos norte-americanos na região.

Destruição em Ras al-Ayn depois de ataques promovidos por tropas da Turquia.[2]

Os turcos, conforme mencionado, atuam na Síria, principalmente no combate aos curdos, uma vez que o governo turco teme que o fortalecimento dos curdos sírios repercuta em movimentos separatistas dos curdos turcos. No entanto, há uma intenção do governo turco de reorientar a política síria de maneira que isso possibilite a sua ascensão como terceira potência no Oriente Médio, além de existirem observadores internacionais que apontam o interesse turco em expandir seu território pelo norte da Síria.

Acesse também: Guerra do Golfo, a luta dos Estados Unidos contra o Iraque

Desastres humanitários

A Guerra Civil Síria é atualmente um dos maiores desastres humanitários em curso. Estima-se que a guerra tenha causado a morte de cerca de 600 mil pessoas, segundo dados do Observatório Sírio para os Direitos Humanos. Além disso, cerca de 13 milhões de pessoas fugiram de suas casas, e desse total, pelo menos seis milhões decidiram fugir da Síria.

Muitos dos refugiados sírios foram para a Europa, o que deu início a uma crise imigratória profunda no continente. Entretanto, a maioria dos sírios decidiu se mudar para a vizinha Turquia, e calcula-se que mais de três milhões de pessoas tenham se estabelecido nesse país. Muitos comentam que a intervenção turca no conflito também visava à contenção do fluxo de refugiados que buscavam atravessar a fronteira da Síria com a Turquia.

Um dos momentos mais tensos do conflito na Síria foram os bombardeios realizados em grandes cidades do país por forças russas e do governo sírio. A consequência direta deles foi a morte de milhares de pessoas, inclusive de muitas crianças. O EI também foi responsável por inúmeras execuções nas diferentes regiões da Síria que dominou.

Os atos de maior repercussão foram os três ataques químicos contra civis na guerra. Os ataques foram tidos por observadores internacionais como conduzidos pelo governo de Bashar al-Assad e aconteceram, em 2013, 2017 e 2018, contra uma região do subúrbio de Damasco, contra Khan Sheikhoun e, mais recentemente, contra Guta Oriental.

Passados 10 anos de duração desse conflito, não existe nenhuma previsão que veja com otimismo o futuro da Síria. O país teve sua população mergulhada na pobreza, sua infraestrutura básica destruída e o acesso à educação negado a milhões de crianças, além de um sistema de saúde deficitário. A possibilidade de um armistício não é muito bem-vista pelos grupos que lutam nessa guerra, e a tendência é que a Síria passe ainda por longos anos de instabilidade.

Créditos das imagens:

[1] Adwo e Shutterstock

[2] fpolat69 e Shutterstock

Por: Daniel Neves Silva

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