O período constitucional da Era Vargas (1934-1937) caracterizou-se por uma intensa polarização política e ideológica entre as forças de direita, em volta da Ação Integralista Brasileira (AIB), e as forças de esquerda, organizadas na Aliança Nacional Libertadora (ANL). A última tentou derrubar o governo de Getúlio Vargas em novembro de 1935 através de uma ação armada ocorrida em alguns pontos do país. Os militares que conseguiram conter a ação a denominaram de Intentona Comunista. Já os membros da ANL, principalmente os militantes do Partido Comunista Brasileiro (PCB), denominaram a ação como o Levante Comunista de 1935. Mas qual a diferença de significado entre Intentona Comunista e Levante Comunista?
No aspecto histórico, a denominação tem o objetivo de depreciar ou de glorificar a ação de acordo com o nome adotado. Para os militares que permaneceram no poder, a ação armada foi apenas uma intenção da ANL, que devido à falta de uma base popular de apoio foi facilmente desbaratada, daí o nome depreciativo de Intentona.
Para os participantes da ação armada, como Luís Carlos Prestes, houve sim uma ação armada, não ficando apenas na intenção. A prova seria os levantes ocorridos em quatro corpos do exército: em Natal, Rio Grande do Norte; em Recife, Pernambuco; e no Rio de Janeiro, cujo levante ocorreu no 3º Regimento de Infantaria e na Escola de Aviação Militar.
Mas quais eram os objetivos desses soldados que se rebelaram contra o governo de Getúlio Vargas?
Esses soldados eram membros da ANL, ou mesmo do PCB, e defendiam a necessidade de se realizar no Brasil uma revolução de caráter burguês, apoiando a burguesia nacional contra o imperialismo estadunidense e buscando o apoio de camadas populares através da luta contra os latifúndios e da distribuição destes aos trabalhadores rurais. Segundo Prestes, presidente de honra da ANL, o movimento era nacionalista, de origem exclusivamente brasileira. [1]
Essa conotação nacionalista proporcionou embates. Primeiro em relação aos fascistas da AIB, que se proclamavam os únicos nacionalistas do Brasil, e contra aqueles que a ANL lutava para que não se formasse um estado fascista, como na Itália, ou nazista, como na Alemanha. Outro embate era contra os que argumentavam que a ação ocorrida em novembro de 1935 havia sido planejada em Moscou, na URSS, pela Internacional Comunista (Komintern).
Realmente, Prestes vivia em Moscou desde 1932 e voltou ao país para organizar a ANL, juntamente a militantes comunistas especialmente destacados para ajudá-lo, como os alemães Arthur Ernst Ewert e Olga Benário (futura esposa de Prestes), o argentino Rodolfo Ghioldi, dentre outros. Prestes conseguiu apoio financeiro da URSS e levantes nacionais contra o imperialismo estadunidense eram uma das medidas a serem apoiadas pelo Komintern.
O levante se iniciou em Natal, cidade em que os soldados do exército já faziam agitação política nos quartéis, através de jornais do PCB, o que levou os comandantes a tomarem medidas para conter a agitação. Aos poucos a base de atuação destes soldados se deteriorou, com transferências, expulsões etc. Por isso resolveram antecipar as ações e, em 23 de novembro de 1935, com as armas nas mãos, tomaram o quartel do exército e também o da polícia, tomando conta da cidade. Segundo Prestes, surgiu assim “o primeiro governo popular nacional revolucionário”, que era o objetivo da ANL para todo o país.
Entretanto, nas outras duas cidades a situação foi distinta. Rapidamente os levantes foram contidos devido à falta de apoio popular, iniciando uma forte repressão em todo o país contra os membros da ANL. Navios de presos se deslocaram do Nordeste para a prisão de Ilha Grande, no Rio de Janeiro. Em 1936, Prestes e Olga Benário foram presos, sendo que Olga foi mandada para a Alemanha nazista. Como era judia, foi encaminhada, grávida, para um campo de concentração.
A intentona, ou levante, serviu para que Vargas e o exército brasileiro, utilizando o fantasma do comunismo, realizassem um novo golpe em 1937, dando origem ao autoritário Estado Novo.
Notas
[1] SILVA, J.L.W. da (org). O feixe e o prisma. v. 1, p. 85-90.