Golpe civil-militar de 1964

O golpe civil-militar aconteceu de 31 de março a 2 de abril de 1964, colocando fim no governo de João Goulart e dando início ao período da Ditadura Militar. Esse golpe foi resultado da articulação de grupos conservadores, que procuravam impor uma agenda autoritária para modernizar do país e barrar os movimentos sociais que atuavam no período.

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Desenvolvimento do golpe civil-militar de 1964

O golpe civil-militar de 1964 foi um acontecimento que colocou fim no período da república de 1946 a 1964. Alguns historiadores o chamam de Quarta República, outros, de Segunda República ou República de 46. Esse foi um período de fortalecimento da democracia representativa do Brasil, mas que foi permeado de tentativas de golpe, das quais a de 1964 obteve sucesso.

  • Cenário político

O golpe de 1964 aconteceu durante o governo de João Goulart, também conhecido como Jango. Esse governo foi tumultuado do início ao fim, sobretudo pelas iniciativas de determinados grupos conservadores para travar o seu andamento.

A posse de João Goulart só foi possível mediante grande esforço de alguns grupos políticos da centro-esquerda e determinadas camadas da sociedade. Esse esforço ficou conhecido como Campanha da Legalidade, porque militares e conservadores da União Democrática Nacional (UDN) não queriam permitir a posse de Jango depois da renúncia de Jânio Quadros, em 1961.

João Goulart assumiu a presidência em 1961 e teve um dos governos mais atribulados da história brasileira.[1]

O governo de João Goulart teve duas fases: parlamentarista e presidencialista. Na fase parlamentarista, o presidente tinha poderes limitados, mas, com o retorno do presidencialismo, Jango pôde colocar em ação o seu projeto de reformas estruturais, que promoveria mudanças nos grandes gargalos da sociedade e da economia brasileira. Esse projeto recebeu o nome de Reformas de Base.

A posse de Jango desagradou não somente a grupos conservadores do Brasil mas aos Estados Unidos, que viam a política de centro-esquerda do gaúcho como um problema para os seus interesses no Brasil. É importante lembrarmos que, no contexto da Guerra Fria, ideais progressistas, como os defendidos por Jango, eram um problema para a política externa norte-americana na América Latina.

O desagrado norte-americano com Jango aumentou com duas ações de seu governo:

  • A Lei de Remessas de Lucros de 1962, que impedia multinacionais de enviar mais de 10% dos seus lucros para fora do Brasil.
  • A política externa independente, praticada pelo Brasil desde o governo de Jânio Quadros.

Por isso o governo norte-americano decidiu interferir nos rumos da política brasileira, financiando grupos conservadores no Brasil. Essa ação dos EUA resultou no surgimento no Instituto Brasileiro de Ação Democrática, o Ibad. Em 1962, descobriu-se que o Ibad recebeu milhões de dólares para financiar candidaturas conservadoras nas eleições disputadas nesse ano.

O objetivo disso era fortalecer ideias de direita e centro-direita, de forma a criar obstáculos para o governo de Jango, barrando as reformas promovidas por ele. O financiamento do Ibad era considerado ilegal aos olhos da legislação da época.

Outros grupos que surgiram durante o governo de João Goulart e trabalharam para tirar sua credibilidade, fomentando discurso antidemocrático e golpista, foram o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (Ipes) e a Rede da Democracia. O primeiro fazia produções audiovisuais e literárias com viés golpista e conservador, e a segunda foi a união de vários veículos de imprensa que consolidaram o discurso da suposta ameaça comunista no governo de Jango.

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  • Radicalização da política

Esse cenário permitiu que a política brasileira se radicalizasse, uma vez que havia projetos que se antagonizavam. O projeto trabalhista, defendido por Jango, procurava promover as reformas estruturais para combater problemas históricos do país, como a desigualdade social. Além disso, havia uma camada da sociedade que demandava melhorias em sua vida e mais direitos sociais e políticos.

O projeto liberal-conservador visava a barrar as mudanças em curso no país e reverter o desenvolvimento da democracia representativa e da partidarização da população brasileira. Esse projeto buscava combater direitos das camadas populares, mantendo o status quo, e promover a modernização econômica do país por um viés autoritário.

O governo Jango, como mencionado, procurou promover as Reformas de Base. O projeto incluía reforma urbana, educacional, agrária, tributária, eleitoral e bancária. Dessas, a reforma agrária foi a mais polêmica e alvo de muita disputa política, pois havia grande divergência na forma como ela seria feita.

A demora na aprovação da reforma agrária fez com que as zonas rurais se tornassem locais de conflito, com as Ligas Camponesas, sindicatos de trabalhadores rurais, invadindo propriedades para exigir que ela fosse feita. No fim, a reforma agrária não aconteceu, e o governo João Goulart perdeu apoio no Congresso.

Houve também uma forte pressão de grupos da esquerda para que outras pautas das Reformas de Base avançassem. Um dos que mais pressionavam o governo para isso era Leonel Brizola, um dos grandes representantes do trabalhismo no Brasil. Essa pressão pelas reformas era explorada pelos conservadores como um sinal de que havia um golpe comunista em curso no país.

Os grupos da direita, por sua vez, articulavam, já desde 1962, a derrubada do governo. Essa articulação contava com grupos do grande empresariado, grupos da grande mídia, políticos conservadores, militares e estrangeiros. Essa mobilização, sobretudo das Forças Armadas, contribuiu para o enfraquecimento da posição de João Goulart.

Houve, inclusive, pequenos levantes militares no governo Jango, como a Revolta dos Sargentos, em setembro de 1963. Esse acontecimento foi um indicativo claro de que a cadeia de comando estava quebrada e a autoridade do presidente sobre as Forças Armadas estava abalada. Toda essa situação de manifestação das esquerdas e de radicalização e insubordinação militar fez com que o presidente tomasse uma ação entendida como desastrosa para o seu governo: enviou uma proposta para decreto de Estado de Sítio, retirada dias depois.

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Como foi o golpe civil-militar de 1964

Ernesto Geisel, Humberto Castello Branco e Artur da Costa e Silva, três militares que governaram o Brasil durante a Ditadura Militar.[1]

Em março de 1964, a situação era delicada, pois a polarização era grande e a posição de Jango era cada vez mais fraca. Nesse mês, os grupos golpistas tinham preparativos antecipados para o golpe, mas a mudança na posição de Jango antecipou as coisas. Em 13 de março, o presidente fez um evento, o Comício da Central do Brasil.

Esse evento contou com cerca de 150 mil pessoas e ficou marcado pela mudança na posição do presidente. João Goulart manifestou sua intenção de abandonar a conciliação política para atuar com os movimentos sociais em defesa da aprovação das Reformas de Base. A resposta conservadora ao presidente aconteceu poucos dias depois.

Em 19 de março, organizou-se a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que contou com cerca de 500 mil apoiantes e tinha como mote a rejeição ao comunismo e o desejo por uma intervenção militar no Brasil. Essa marcha foi idealizada pelo Ipes, demonstrando a organização dos golpistas e a existência de um apoio expressivo a esses ideais na sociedade brasileira.

Ainda assim, o apoio ao presidente João Goulart era considerável. O historiador Marcos Napolitano aponta que o presidente tinha avaliações positivas da maioria da população brasileira. O Ibope de 1964 apontava que 45% da população consideravam o governo dele “ótimo” ou “bom” e 49% tinham intenções de votar nele em 1965. Por fim, 59% da população apoiavam as Reformas de Base|1|.

Essa apoio popular de nada adiantou, uma vez que o golpe em conspiração estava planejado para acontecer em 10 de abril, com envolvimento dos militares, do exército norte-americano e de membros do Ipes. No entanto, um levante militar liderado por Olympio de Mourão, em Juiz de Fora, a partir de 31 de março, antecipou o acontecimento das coisas.

Olympio Mourão iniciou esse levante com tropas estacionadas em Juiz de Fora e marchou para o Rio de Janeiro com o intuito de derrubar o presidente. O levante contou com o apoio de nomes como Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, enquanto Castello Branco, líder do golpe que seria realizado em 10 de abril, a princípio, não o apoiou, temendo que fosse derrotado.

Muitos grupos da esquerda esperaram uma resposta da presidência para iniciar uma resistência ao golpe. Jango teve oportunidades para tal, mas ele se recusou a resistir porque sabia que isso levaria o país para o caminho da guerra civil. Sem ação do presidente, a chance de resistência ao golpe se dissipou.

No dia 2 de abril, os parlamentares brasileiros resolveram apoiar o golpe militar em curso por meio de um golpe parlamentar. O senador Auro de Moura tomou uma ação ilegal e decretou a vacância da presidência porque o presidente havia abandonado o cargo, sob a alegação de que ele havia fugido do país. Nesse dia, Jango ainda estava em território brasileiro.

Uma junta militar tomou o controle do governo brasileiro e impôs o Ato Institucional nº1, dando início às arbitrariedades que marcaram a Ditadura Militar. Dias depois, o marechal Humberto Castello Branco foi “eleito” presidente do Brasil. Sua eleição aconteceu de maneira indireta. Era o estabelecimento da Ditadura Militar.

Notas

|1| NAPOLITANO, Marcos. 1964: História do regime militar brasileiro. São Paulo: Contexto, 2016. p.47.

Créditos da imagem:

[1] FGV/CPDOC

Por: Daniel Neves Silva

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