Baile da Ilha Fiscal

Festa de Arromba.
Nos fins da década de 1880, o regime monárquico brasileiro se via abalado por uma série de acontecimentos que ameaçavam seriamente a sua manutenção. O fim da escravidão, a ideologia liberal, a insatisfação dos militares e querelas com a Igreja compunham o vasto leque de tensões que ali então se desenvolviam. Nos idos de novembro de 1889, militares e republicanos armaram o golpe que deu fim ao governo de Dom Pedro II.

No dia 9 de novembro, seis dias antes da Proclamação da República, o Visconde de Ouro Preto, então Presidente do Conselho de Ministros, resolveu organizar uma enorme festa em homenagem aos oficiais da embarcação chilena Almirante Cochrane. Do ponto de vista político, o evento servia de pretexto para que os apoiadores da monarquia aproveitassem da ocasião para demonstrar o vigor do Império. E, por essa razão, resolveram fazer o suntuoso baile da Ilha Fiscal.

A ostentação da festa já podia ser notada na Praça Quinze, local que dava acesso às embarcações que levavam os convidados até a ilha. Decoração em flores, candelabros à gás e uma orquestra ambientavam os participantes para um dos maiores eventos sociais de todo o regime imperial. Igualmente decorados, as embarcações faziam o seu caminho até que fosse possível observar o recém-construído prédio que servia como posto de vigilância aduaneira.

Por volta das dez horas da noite, a Família Real adentrou o suntuoso local adornado por balões venezianos, palmeiras, vegetação nativa, várias bandeiras do Brasil e do Chile, e outra infinita série de artigos de luxo. No fim das contas, estima-se que uma “bagatela” de 250 contos de réis arcou com todo aquele estrondoso desperdício de recursos e comida. Em termos proporcionais, o valor correspondia a 10% do orçamento destinado a toda província do Rio de Janeiro!

Já nessa época, incorporando ares bastante europeus, o cardápio era todo encapado em cetim e suas opções estavam todas escritas em francês. Entretanto, por conta de diferenças naturais, os pratos da festa sofreram adaptações diversas entre as quais podemos destacar o oferecimento do “gâteaux de mandioca”, “bijupirá à la ravigotte”, “jacutinga à la ravigotte” e o “macuco truffé à la broche”. Entre os termos da alta culinária francesa, as carnes de animais brasileiríssimos saciavam a fome do público.

Fazendo par com os comes, a farta bebida fora selecionada entre as mais prestigiadas marcas do mercado consumidor europeu. O baile ofereceu 10 mil litros de cerveja, 188 caixas de vinho e 80 caixas de champanhe. Como resultado, no dia posterior, foram encontradas várias peças de roupa. Além de trajes acessórios, algumas peças íntimas indicavam claramente que os excessos do baile da Ilha Fiscal não ficaram apenas no comer e beber.

Apesar do sumiço de vários registros, alguns documentos listaram o consumo de 14 mil sorvetes, 800 quilos de camarão, 64 faisões, 255 cabeças de porco, 500 perus e 20 mil sanduíches. Para uma clientela que ultrapassou a marca de 400 mil convidados, o banquete começou a ser servido depois da uma hora da manhã. Para que a coisa não desandasse, os pratos eram servidos em diferentes turnos. Dessa forma, tinha gente esperando para fazer uma boquinha até o raiar do dia.

A gastança do evento acabou tendo contornos bastante irônicos se comparados às intenções que levaram o Visconde de Ouro Preto a organizar essa festa de arromba. A seguida chegada dos militares ao poder mostrava que o riso e a fartura vividos na Ilha Fiscal não sobrepujariam as movimentações políticas daquela época. Por meio de uma quartelada, o rei Dom Pedro II e os representantes da monarquia cederam lugar para que a República agora pudesse bailar.
Por: Rainer Sousa

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