As queimadas na Amazônia são uma prática cada vez mais comum e estão diretamente associadas à retirada da cobertura vegetal, tendo como principais motivações a limpeza de áreas desmatadas e a abertura de novas áreas para lavouras ou pastagens. Embora tenha iniciado nos anos 1930, foi a partir da década de 1970 que houve a intensificação do uso das queimadas na Floresta Amazônica, causadas principalmente pela ação humana. A Amazônia foi o bioma mais atingido pelo fogo em 2020, registrando mais de 70 mil focos ativos de queimadas.
Entre as consequências para o meio ambiente, podemos citar a perda de biodiversidade com a morte da fauna e devastação da vegetação nativa, redução da qualidade dos solos e queda da qualidade do ar, que afeta diretamente a população local. Em maior escala, pode haver a transformação dos ciclos de chuva em outras regiões do Brasil e, ainda, a aceleração das mudanças climáticas, resultante da maior emissão de carbono na atmosfera.
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Contexto histórico e origem das queimadas
A prática das queimadas na Amazônia está diretamente associada às políticas estatais de ocupação estratégica do território onde se localiza o bioma e, também, à exploração de suas potencialidades econômicas.
A exploração econômica da Amazônia não é recente. No século XIX teve início o processo de extração da borracha, condicionada pela demanda externa proveniente da Inglaterra. No entanto, foi a partir da década de 1930 que a Amazônia passou a ser vista pelo Estado brasileiro como um território estratégico e que necessitava de proteção contra os interesses estrangeiros, alguns dos motivos pelos quais o presidente Getúlio Vargas instituiu a “Marcha para o Oeste”.
Com a crescente ocupação das regiões Centro-Oeste e Norte do Brasil, áreas por onde o bioma amazônico avança, cresceu também o desmatamento para a construção de infraestrutura urbana e para o desenvolvimento das atividades econômicas da nova população que chegava à região. A queimada é uma das práticas utilizadas para a retirada da vegetação e limpeza dos terrenos a serem explorados.
Nos anos subsequentes, a preocupação com o território da Amazônia perdurou, sobretudo durante os regimes militares, que tiveram início em 1964. Foram realizadas grandes obras de engenharia que tiveram como objetivo a maior integração da região Norte com as demais regiões do Brasil. Inaugurada em 1972, a rodovia Transamazônica (BR-230) é o principal exemplo desse período, sendo construída a partir da remoção de grandes áreas de mata nativa. A instalação da Zona Franca de Manaus e, com isso, a criação de um novo polo industrial na capital amazonense no final da década de 1960 também foram responsáveis pelo aumento do desmatamento na Amazônia.
A década de 1970 foi marcada ainda pela expansão da fronteira agrícola brasileira, realizada a partir de incentivos governamentais que atraíram grandes fazendeiros do Sul e Sudeste para as regiões Norte e Centro-Oeste. No Norte, a Superintendência da Amazônia (Sudam) era o órgão responsável pela administração dos programas de incentivos aos produtores rurais. Com isso, houve o aumento da utilização das queimadas no preparo do solo para a produção agropecuária, prática que ganha cada vez mais espaço na Amazônia.
Inicialmente o desmatamento se concentrava nas áreas de transição entre outros biomas e a Floresta Amazônica. Entretanto, os focos de desmatamento e os cultivos de soja se interiorizam a partir da década de 1990 e seguem avançando. Nos últimos 30 anos, houve um crescimento muito grande do número de cabeças de gado na Amazônia, sendo atualmente a pecuária a principal responsável pelo uso do fogo para a retirada da vegetação e formação de pastagens.
Quanto às suas origens, as queimadas que acontecem na Amazônia são causadas pela ação humana. A ocorrência de focos naturais de incêndio é rara. As queimadas deliberadas tendem a acontecer no período seco, que vai de julho a outubro, o que facilita a queima e propagação do fogo.
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Tipos de queimadas
As queimadas podem ser naturais (espontâneas) ou causadas pela ação antrópica. Em se tratando do bioma amazônico, a principal ocorrência de queimadas é a do tipo causado pela ação do homem. Essas podem ser tanto deliberadamente provocadas quanto acidentais.
Com relação à ação antrópica, podemos destacar duas ocorrências. O fogo pode ser rasteiro, propagando-se pela superfície do solo e eliminando, assim, a camada de serrapilheira e os elementos que trazem maior fertilidade e proteção aos solos da floresta. As queimadas provocadas podem também preceder o desmatamento de áreas, sendo iniciadas justamente para a eliminação da vegetação nativa, ou ocorrer após o corte e derrubada da vegetação, para a limpeza.
O fogo natural tem origem a partir da queda de raios durante tempestades. Esse tipo de queimada é menos recorrente quando se trata do bioma amazônico, sendo mais comum nos Cerrados.
Desmatamento e queimadas
As queimadas que acontecem na Amazônia brasileira estão diretamente atreladas à prática do desmatamento. De acordo com um levantamento realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e apurado pela WWF Brasil|1|, em 2019 cerca de 30% das queimadas identificadas na Amazônia foram realizadas após a retirada da cobertura vegetal por meio do corte das árvores. O fogo representa o estágio final do ato de desmatar. Nessa forma de atuação, as queimadas são utilizadas para a retirada dos tocos de árvores e outros reminiscentes de vegetação, promovendo a limpeza da área.
Considerando o ano de 2019, um relatório|2| publicado pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), mais da metade da área desmatada no bioma foi consequência da ação do fogo, contabilizando 5.500 quilômetros quadrados. O desmatamento pode atuar ainda como catalisador das queimadas, uma vez que maior área de solo fica exposta e a vegetação que ali restou resseca, podendo servir de combustível para a ampliação do fogo e causar incêndios de maiores proporções. Uma das marcas deixadas pelo desmatamento e pelo fogo são as chamadas cicatrizes de queimadas.
Motivação das queimadas na Amazônia
A motivação para as queimadas na Amazônia é econômica e pode ter diversos propósitos, como a abertura de novas áreas para lavouras agrícolas, criação de pastagens para a pecuária extensiva ou incremento da infraestrutura urbana — instalação de estradas e rodovias, por exemplo.
Em um sentido contrário, o próprio desenvolvimento e as melhorias impostas à rede de serviços da região pode influenciar|3| a atração de produtores e abertura de áreas para atividades agropecuárias, consequentemente levando à remoção da cobertura vegetal.
Igualmente no âmbito da exploração econômica, a atividade madeireira também é uma das motivações para as queimadas no bioma amazônico, seguida da mineração. A especulação imobiliária e a disputa por terras podem ainda estar por trás das queimadas na Amazônia.
O que as queimadas na Amazônia causam ao meio ambiente?
As queimadas são responsáveis por grande devastação no ecossistema da Amazônia, causando severos danos ao equilíbrio ambiental em escala local, nacional e global. Em razão da não adaptação da flora e da fauna desse bioma à ocorrência sazonal do fogo, como acontece no Cerrado, os danos causados pelas queimadas podem ser irreversíveis. São algumas dessas consequências:
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destruição da biodiversidade do bioma;
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queda da qualidade dos solos e prejuízos à sua estrutura, tornando-os mais suscetíveis aos processos de erosão;
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emissão de partículas tóxicas na atmosfera que prejudicam a qualidade do ar;
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emissão em grandes proporções de carbono na atmosfera na forma de CO2 – carbono esse proveniente do estoque das árvores da Floresta Amazônica –, contribuindo para o efeito estufa e aumento do aquecimento global;
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alterações climáticas;
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redução da umidade relativa do ar e alterações de temperatura local, levando a transformações no regime hídrico em escalas variáveis, podendo atingir todo o país. Isso ocorre principalmente devido ao fenômeno dos rios voadores da Amazônia, responsáveis pela ocorrência de precipitação em outras regiões do Brasil (Centro-Oeste, Sudeste, Sul).
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Dados das queimadas na Amazônia
O Programa Queimadas do Inpe tem sido a principal ferramenta de monitoramento das queimadas no território nacional. O bioma da Amazônia foi o mais atingido pelo fogo no ano de 2020, somando 48,1% dos focos ativos registrados em todos os biomas brasileiros. Em segundo lugar está o Cerrado, com 28,4%, e o Pantanal, com 11%.
Considerando todo o período de tempo disponível, o bioma amazônico foi aquele onde mais houve a ocorrência de focos de queimadas no país desde 1998. Além disso, houve um crescimento muito grande nos valores absolutos: enquanto no início da série histórica eram registrados 43.229 focos, até setembro de 2020 foram 73.909 ocorrências.
O ano em que houve o maior número de focos ativos de queimadas na Amazônia brasileira foi em 2004, quando os números chegaram a 218.637. Levando em consideração a Amazônia Legal, os satélites identificaram 110.608 focos de queimadas até setembro de 2020. Dos estados por onde o bioma amazônico se estende, o Mato Grosso foi o mais atingido, com 38.444 focos, maior número registrado no território nacional. Na sequência aparecem o Pará, com 24.770, e o Amazonas, com 14.772 de focos ativos de queimadas.
Notas
|1| Um em cada três focos de queimadas na Amazônia tem relação com o desmatamento (Para acessar, clique aqui).
|2| Para acessar o relatório, clique aqui.
|3| O papel de gado e soja no ciclo de desmatamento (Para acessar, clique aqui).