Os conflitos pela água vêm se ampliando em todo o mundo, havendo, em muitas regiões, tensões e articulações geopolíticas em torno do domínio estratégico do recurso.
Ao lado do petróleo, a água potável é o mais estratégico dos recursos. Mas, ao contrário do primeiro, ela não possui formas alternativas, sendo fundamental para o funcionamento das sociedades. Em muitos países, a água é realmente vista como um tesouro em razão de sua baixa disponibilidade em níveis locais e até regionais. Por isso, muitas disputas envolvem a sua posse e controle, e muitas outras estão por vir, haja vista que o século XXI promete ser o século dos conflitos internacionais pela água.
Desde tempos antigos, já existem registros de conflitos pela água envolvendo nações e civilizações. No entanto, até hoje, as disputas quase sempre envolveram a posse de territórios estratégicos que abrigam nascentes e leitos de rios. O grande temor é que, em um futuro próximo, a disputa pela água insira-se em um bojo imperialista e esse recurso seja utilizado tanto para abastecimento quanto para comercialização internacional.
O primeiro conflito envolvendo o uso da água que se tem notícia ocorreu há cerca de 4.500 anos e envolveu duas cidades-estados da Mesopotâmia: Umma e Lagash, que disputavam áreas que abrangiam os rios Tigre e Eufrates para irrigação.
Esses mesmos rios protagonizam, nos últimos tempos, uma tensão que também pode transformar-se em um conflito entre Turquia, Iraque e Síria, uma vez que as nascentes desses rios encontram-se no território turco e o abastecimento é realizado para os três países. Em 1998, a construção de uma barragem por parte da Turquia gerou certa tensão, pois a diminuição da vazão para a jusante fez com que Iraque e Síria elevassem o tom em reprovação. Uma forte seca, no final da década passada, também contribuiu para que os iraquianos e os sírios passassem a questionar mais veementemente os turcos, que responderam negando as acusações de que estariam diminuindo a vazão dos rios para os demais países. Embora acordos tenham sido feitos, a situação é considerada delicada.
Em 1967, durante a Guerra dos Seis Dias, o Estado de Israel, então recém-criado, expandiu suas fronteiras e ocupou várias áreas de países adjacentes no Oriente Médio. Uma delas, as Colinas de Golã – então pertencentes à Síria –, além de apresentarem uma posição geográfica estratégica, abrangiam as nascentes do Rio Jordão, muito utilizado para a irrigação no local. Israel, inclusive, controla os recursos hídricos subterrâneos em suas áreas e na Cisjordânia, sendo frenquentemente acusado de impedir que os palestinos utilizem-nos, em uma articulação notadamente estratégica. Vale lembrar que Israel, Jordânia e Palestina (os três países locais) reúnem 5% da população mundial e apenas 1% das reservas hídricas.
Recentemente, a disputa pela água vem encontrando atuações até de grupos terroristas. No Iraque e na Síria, o Estado Islâmico vem atuando no sentido de tentar controlar algumas fontes de água, pois sabe que isso lhe dará uma maior vantagem em termos geopolíticos e bélicos. Com o controle da água – principalmente no caso do Iraque –, torna-se completamente possível impor várias sanções e estabelecer um amplo controle da área.
Na África, tensões e até conflitos também acontecem em torno da posse e controle de recursos hídricos. Na bacia do Rio Nilo, há uma disputa por sua maior utilização por parte de Egito, Etiópia, Uganda e Sudão, o que pode transformar-se em um conflito generalizado de graves impactos caso acordos não sejam realizados. O mesmo caso acontece com a bacia do rio Okavango, que abrange áreas territoriais de Angola, Botswana e Namíbia.
Portanto, é preciso uma ação conjunta internacional para evitar a escassez de água em várias partes do mundo, além da implementação de medidas para garantir sua melhor distribuição. No futuro, como já dissemos, conflitos generalizados e graves podem instalar-se, isso sem falar nos conflitos locais e regionais que podem envolver a população e, até mesmo, o contrabando de água feito por desvios ilegais.